An edition of A Sublimidade do Perdão (2016)

A Sublimidade do Perdão

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Last edited by Silvio Dutra
September 2, 2016 | History
An edition of A Sublimidade do Perdão (2016)

A Sublimidade do Perdão

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Nós temos o dever de perdoar a todo irmão que nos tenha ofendido e que demonstre um verdadeiro arrependimento quanto ao mal que nos fez.
Mas até mesmo quando uma pessoa não se arrepende nos é ordenado que a amemos e que oremos pelo seu bem (Lc 6.27).
A diferença está no fato de que quando a pessoa que nos prejudicou não se arrepende, apesar de desejarmos o bem dela, nós não podemos levar a cabo a reconciliação ou o retorno à comunhão.
Thomas Watson disse apropriadamente que: "Nós não somos chamados a confiar num inimigo; mas nós somos chamados a perdoá-lo.”.
Assim, você pode olhar alguém na face e dizer: eu o perdoo, mas eu não confio em você.
Mas em dizer isto e afirmar que nunca mais aceitará qualquer esforço daquela pessoa em restaurar a confiança perdida e que não nos preocupamos que venha a ser arruinada, com isto demonstramos um espírito não perdoador, e ficamos nós mesmos sujeitos às correções do Senhor.

Publish Date
Publisher
Silvio Dutra
Language
Portuguese
Pages
110

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Edition Availability
Cover of: A Sublimidade do Perdão
A Sublimidade do Perdão
2016, Silvio Dutra
Paperback in Portuguese

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Book Details


Table of Contents

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A474
Alves, Silvio Dutra
A sublimidade do perdão/ Silvio Dutra Alves. – Rio de
Janeiro, 2015.
110p.; 14,8x21cm
1. Teologia. 2.Reconciliação. 3. Graça. 4. Amor
5. Misericórdia. I. Título.
CDD 230
CDD 230.227
3
Sumário
Perdoa as Nossas Iniquidades e dos Nossos Pecados Jamais se Lembrará..........
4
Pecado Desfeito como a Nuvem....................
7
Salmo 103.9..............................................................
9
O Perdão dos Pecados.........................................
12
Perdão Comprovado...........................................
70
Ampliação do Entendimento do Significado do Perdão.........................................
71
A Quem Devemos Perdoar? ...........................
79
A Necessidade Crucial do Perdão................
82
Como Nós Perdoamos Nossos Devedores.................................................................
90
Como Perdoar 70 x 7? ........................................
98
4
Perdoa as Nossas Iniquidades e dos Nossos Pecados Jamais se Lembrará
“Não viu iniquidade em Jacó, nem contemplou desventura em Israel; o SENHOR, seu Deus, está com ele, no meio dele se ouvem aclamações ao seu Rei.” (Números 23.21)
Quando a impiedade mundana, representada no príncipe midianita chamado Balaque, se levantou para que o povo de Deus fosse amaldiçoado, Deus fez com que, mesmo pela boca de um falso profeta – Balaão – fosse proclamada a verdade de que o seu povo é um povo para sempre abençoado na união com o seu Rei – Cristo.
Um povo que ninguém poderá ter eficácia em suas maldições dirigidas contra ele, e nem o próprio Deus jamais o amaldiçoará, porque Jesus se fez maldição no lugar deles, para que fossem resgatados da maldição da Lei para todo o sempre.
Foi por causa da justificação que é tão somente pela graça, mediante a fé, que eles alcançaram esta bênção perpétua.
E comprova, o não serem mais amaldiçoados para uma condenação eterna e que o foram exclusivamente pela graça de Jesus e por
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nenhum mérito neles próprios, o fato de que em sua grande maioria não chegam a ser confirmados em toda boa palavra e boa obra (2 Tes 2.17), conforme a trindade divina neles opera visando a tal propósito.
Deus os salvou e os conduzirá à glória celestial, e completará o trabalho de aperfeiçoamento em santificação neles iniciado, ainda que seja quando entrarem no céu.
Mas quanto entristece ao Espírito Santo que haja tantos crentes descuidados com a sua salvação, e que não a desenvolvem com temor e tremor, por não permitirem que Deus opere neles tanto o querer quanto o efetuar.
É lamentável a negligência, a indiferença e a insensibilidade que muitos manifestam contra Cristo e os Seus mandamentos. Não têm fome e sede de justiça. Foram salvos mas parecem ainda pertencer ao mundo, pois não se vê neles a graça crescendo em graus, em verdadeira transformação de seu modo de agir, pensar e falar.
Ainda que estejam debaixo de uma sadia ministração do evangelho verdadeiro, isto não chega a lhes atingir, porque seus corações são frios, carnais e mundanos.
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Quando são despertados pela oração intercessória em favor deles, a sua devoção ao Senhor dura apenas um breve momento, e logo retornam ao seu antigo modo de vida, porque não perseveram na comunhão dos santos e na prática dos deveres espirituais da oração, da meditação da Palavra, da vigilância contra o pecado e contra as tentações do Inimigo.
À medida que o tempo passa, mais tem caminhado a Igreja de nossos dias para a grande e final apostasia que precipitará o surgimento do Anticristo e a volta do Senhor.
Graças a Deus por sua grande misericórdia e graça, porque se dependesse da nossa confirmação na verdade, na justiça e na santidade, quantos não ficariam fora do céu? E como poderia ser dito deles que Deus “não viu iniquidade em Jacó, nem contemplou desventura em Israel”?
Não abusemos portanto da Sua misericórdia e longanimidade, porque apesar de muitos serem salvos como que pelo fogo, todavia, há grandes danos para aqueles cujas obras não permanecerem e que forem queimadas pelo fogo que Deus usa para provar a genuinidade delas.
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Pecado Desfeito como a Nuvem
“Desfaço as tuas transgressões como a névoa e os teus pecados, como a nuvem; torna-te para mim, porque eu te remi.." (Isaías 44.22)
Observe atentamente o símile instrutivo: nossos pecados são como uma nuvem. Como as nuvens são de muitas formas e tons, assim são as nossas transgressões. Como as nuvens obscurecem a luz do sol, e escurecem a paisagem abaixo, por isso os nossos pecados escondem de nós a luz do rosto do Senhor, e nos levam a sentar na sombra da morte. São coisas nascidas da terra, e ressuscitam dentre os charcos de nossa natureza, e quando assim coletados a sua medida está cheia, eles nos ameaçam com vendavais e tempestades. Ai de mim! que, ao contrário das nuvens, nossos pecados, não nos dão chuvas, mas ameaçam nos inundar com um dilúvio de fogo de destruição. Ó nuvens negras do pecado, como pode ser bom tempo nas nossas almas enquanto vocês permanecerem?
Que o nosso olhar alegre repouse sobre o notável ato da divina misericórdia - "desfazendo as nuvens de pecados" - o próprio Deus aparece em cena, e em benignidade divina, ao invés de manifestar a sua ira, revela a sua graça: ele de uma vez e para sempre efetivamente remove o mal, não soprando para longe a nuvem, mas
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apagando-a da existência de uma vez por todas. Contra o homem justificado nenhum pecado permanece, a grande operação da cruz tem eternamente removido suas transgressões dele. No cume do Calvário o grande feito, pelo qual o pecado de todos os escolhidos foi para sempre lançado fora, foi completa e efetivamente realizado.
Vamos obedecer de modo prático o mandamento gracioso: “torna-te para mim”. Por que pecadores perdoados deveriam viver distantes do seu Deus? Se temos sido perdoados de todos os nossos pecados, vamos sem temor legal acessar com mais ousadia ao nosso Senhor. Vamos lamentar as apostasias, mas não vamos perseverar nelas. Lutemos bravamente, no poder do Espírito Santo, para retornarmos a uma maior e possível proximidade de comunhão com o Senhor. E que o Senhor nos restaure neste dia!
Texto de Charles Haddon Spurgeon, traduzido e adaptado pelo Pr Silvio Dutra.
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Salmo 103.9
“Não repreenderá perpetuamente, nem para sempre conservará a sua ira.” (Salmo 103.9)
Quanto tempo dura a ira de uma pai ou de uma mãe depois de ter repreendido a seu filho?
Se este filho é amado por eles a ira durará para sempre por causa do desatino que cometeu?
Todos os que são pais amorosos sabem muito bem qual é a resposta.
Por vezes nossos filhos se mostram renitentes e rebeldes por não pouco tempo em relação a determinado problema a que têm dado causa.
Todavia, por maior que seja a contrariedade que isto possa causar em nós, depois de certo tempo tornamos a ser favoráveis a eles sem que isto leve muito tempo.
Ora, se nós, falhos e limitados pecadores agimos desta forma, quanto mais o nosso Pai celestial que é perfeito em amor, justiça e bondade?
Daí o salmista ter se expressado nos termos do nosso texto, pois conhecia por experiência própria qual é o caráter de Deus.
Ele tinha sido alvo do desagrado do Senhor em determinadas ocasiões, e no pecado com Bate-
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Seba, sua harpa ficou desafinada por cerca de um ano, e o seu espirito definhava debaixo dos juízos corretivos de Deus, pois não havia até então achado lugar para arrependimento, convencendo-se da grande transgressão que havia cometido.
Deus já havia se tornado favorável a ele, mas como se achava endurecido pelo pecado, não pôde contemplar Seus braços amorosos abertos para recepcioná-lo, depois de ter-se lavado com as lágrimas do arrependimento.
Mas aprendeu a lição e a compartilha conosco neste Salmo, de modo que possamos aprender que conforme afirma a Escritura a ira de Deus de um breve momento não passa, porque de outra forma seríamos todos consumidos.
Lembro-me agora da passagem quando nos foi feita a promessa do perdão de Cristo por causa do evangelho, no texto de Isaías 40, no qual o Senhor convoca consoladores para o seu povo, depois de tê-lo castigado devidamente pelos seus pecados.
Assim, então, você que se achou debaixo da palmatória corretiva do Senhor, que se manifestou sobretudo pela falta de paz e pelas próprias circunstâncias da vida que lhe mostraram o quanto Ele estava aborrecido com os seus maus caminhos, tente observar por esta
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fresta de luz que se abre para que você possa ver que o tempo da correção já passou, que é hora de derramar lágrimas não mais de amargura e desânimo, mas de arrependimento, de alegria e de esperança, de um novo recomeçar com Deus.
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O Perdão de Pecados
Nota Introdutória:
Quando lemos esta tradução e adaptação feitas pelo Pr Silvio Dutra, de um texto de William Bates, em domínio público, podemos entender quanto o verdadeiro evangelho exposto nas Escrituras, tem sido obscurecido e desviado do seu principal significado em nossos dias presentes, especialmente por influência do consumismo desenfreado e da busca de prosperidade material ao custo da negligência das necessidades do espírito, que têm moldado uma mentalidade que vislumbra prioritariamente as coisas temporais e não o reino de Deus e a sua justiça.
Não é surpreendente portanto que a própria igreja cristã, esteja, em grande parte, aprisionada pelos ditames da mídia secular, quando cristãos se empenham na mesma busca daquelas coisas que os gentios procuram, e fazem da fé o simples uso para alcançar tais objetivos.
Daí decorrem os ensinos focados em prosperidade material, ministração de psicologia aplicada, e tantos outros, em substituição ao puro evangelho de Cristo, em muitas igrejas ditas cristãs.
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Não são poucos os cristãos que não possuem um conhecimento adequado do que seja o evangelho, ou a sã doutrina bíblica, e que têm feito uma aplicação do conteúdo das promessas de salvação pela fé em Cristo, pelo perdão dos nossos pecados, pela fé nele, a um mero diagnóstico e busca de soluções para problemas temporais, relativos à esfera financeira, sentimental, emocional, e a outros interesses diferentes daquilo para o que a fé foi designada, conforme o dizer do apóstolo: “obtendo o fim da vossa fé: a salvação da vossa alma.” (I Pe 1.9).
Seguramente, a produção das Escrituras e o envio do Filho de Deus a este mundo para salvar pecadores, não consistiu na elaboração de um manual de autoajuda para descobrirmos um meio de tirar o melhor desta vida que temos aqui neste mundo.
Temos assim nas sábias palavras de William Bates, um resumo daquilo que é o evangelho verdadeiro, tal e qual ele foi planejado e revelado por Deus na pessoa e obra de nosso Jesus Cristo.
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O Perdão de Pecados
"Mas contigo está o perdão, para que sejas temido." (Salmo 130.4)
O salmista, no primeiro e segundo versos, se dirige a Deus com os desejos sinceros de suas misericórdias salvíficas: "Das profundezas clamo a ti, Senhor. Escuta, Senhor, a minha voz; estejam abertos os teus ouvidos às minhas súplicas.”
Ele humildemente deplora a severa inquirição da justiça divina; “Se observares, Senhor, iniquidades, quem, Senhor, subsistirá?” (verso 3). Se Deus observasse nossos pecados com um olho preciso, e nos chamasse para um ajuste de contas, quem poderia estar de pé em juízo? Quem poderia suportar esta prova de fogo? Os melhores santos, embora nunca sejam tão inocentes e irrepreensíveis aos olhos dos homens, embora nunca sejam tão vigilantes e atentos sobre seus corações e caminhos, não estão isentos dos pontos de fragilidade humana, que de acordo com o rigor da lei, iria expô-los a uma sentença condenatória.
Ele encontra alívio se apoiando sob esta apreensão temível com as esperanças de misericórdia: "Mas contigo está o perdão, para que sejas temido." É o teu poder e a tua vontade, perdoar os pecadores arrependidos que
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retornam, "para que sejas temido". O temor de Deus nas Escrituras significa a santa reverência humilde a ele, como nosso Pai celestial e Soberano, que nos faz cautelosos para que não o ofendamos, e tenhamos cuidado em agradá-lo. Por isso, o temor de Deus é abrangente em todas as religiões, "o dever de todo homem", para o qual isto é uma introdução, e é o principal ingrediente da mesma. A compaixão e a misericórdia de Deus é a causa de um temor filial, misturado com amor e compromisso dos homens. Outros atributos, sua Santidade que emoldurou a lei, a justiça que ordenou o castigo do pecado, o poder que o inflige, torna sua majestade terrível, e causa uma fuga dele como um inimigo. Se tudo deve perecer por seus pecados, nenhuma oração ou louvor os levará ao céu, toda a adoração religiosa cessará para sempre, mas sua terna misericórdia prontamente recebe os humildes suplicantes, e os restaura em seu favor, e isto nos leva a amá-lo e admirá-lo, e também nos conduz para perto dele.
Há duas proposições a serem considerados no versículo do nosso texto:
I. Que o perdão pertence a Deus.
II. Que o perdão misericordioso de Deus é um poderoso motivo de adoração e obediência a ele.
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Quanto à primeira proposição é necessário considerar,
1. O que está contido no perdão.
2. Os argumentos que demonstram que o perdão pertence a Deus.
1. O que está contido no perdão.
Isto supõe necessariamente pecado, e o pecado supõe uma lei que é violada por ele: a lei implica um legislador soberano, a cuja vontade declarada a sujeição é devida, e que exigirá uma prestação de contas no julgamento da obediência ou desobediência dos homens à sua lei, e que atribuirá recompensas e punições conforme for o caso.
Deus pelos mais claros títulos "é o nosso rei, nosso legislador e juiz”; porque ele é nosso criador e preservador, e consequentemente possui uma plena propriedade de nós, e autoridade absoluta sobre nós; e por sua soberana e singular perfeição está qualificado para nos governar. Um ser criado está necessariamente em um estado de dependência e sujeição. Todas as espécies de criaturas do mundo são ordenadas por seu Criador; seus "reino domina sobre tudo."
Criaturas meramente instintivas são conduzidas pelos impulsos da natureza para
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suas ações, e não por terem qualquer luz para distinguir entre o bem e o mal moral, elas não têm escolha, e são incapazes de receber a lei, mas criaturas inteligentes são dotadas de faculdades judiciosas e livres, e têm entendimento para discernir entre o bem e o mal moral, e para escolher ou rejeitar o que lhes é proposto, e são capazes de ter uma lei para dirigir e regular a sua liberdade.
Para o homem, a lei foi dada pelo Criador, (a cópia de sua sabedoria e vontade) a qual possui todas as perfeições de uma regra. Ela é clara e completa, ordenando o que é essencialmente bom, e proibindo o que é essencialmente mau. Deus governa o homem em conformidade com a sua natureza, e nenhum serviço é agradável a ele, senão o quer for o resultado da nossa razão e escolha, a obediência dos nossos supremos poderes principais.
Desde a queda no pecado, a luz do entendimento comparada com a descoberta da gloriosa condição que havia em nosso estado original, ou é como o crepúsculo da noite, quando cai um véu escuro sobre o mundo, ou como a alva da manhã, quando o sol nascente começa a dispersar a escuridão da noite. Eu acho que esta última comparação é mais justa e regular; pois é dito que o Filho de Deus "ilumina todo homem que vem ao mundo." A luz inata descobre que há uma linha reta da verdade para regular o nosso
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julgamento, e uma linha reta de virtude para regular nossas ações. A consciência natural é um princípio de autoridade, dirigindo-nos a escolher e a praticar a virtude, e para evitar o vício. É pouco provável que qualquer um seja tão prodigiosamente ímpio, que não esteja convencido da retidão natural que há em todas as coisas criadas: eles podem distinguir entre o que é justo e o que é fraudulento nas relações, e reconhecem no geral, e no julgamento de outros, a equidade das coisas, embora se iludam com a força da convicção na sua aplicação para si mesmos. Agora, já que a razão comum descobre que há uma regra comum, deve haver um juiz comum perante o qual os homens são responsáveis pelo desvio ou conformidade de suas ações a essa regra. A lei de Deus é revelada em sua pureza e perfeição na Escritura.
A lei obriga primeiro à obediência, e na sua negligência, à punição. O pecado é definido pelo apóstolo João como sendo "a transgressão da lei." A omissão daquilo que é ordenado, ou fazer o que é proibido, é pecado. Não somente as cobiças que irrompem em ações e evidências, mas inclinações interiores, contrárias à lei, são pecado. Daqui resulta uma culpa sobre cada pecador, que inclui a imputação da culpa e a obrigação de punição. Há uma conexão natural entre o mal da ação, e o mal do sofrimento: a violação da lei é justamente vingada pela punição da pessoa que a quebra. É uma
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imaginação impossível, que Deus deveria dar uma lei não executada com uma sanção. Isso seria lançar uma mancha sobre a sua sabedoria, pois a lei tornaria nula a si mesma, e derrotaria os fins pelos quais fora dada; seria imputar uma alta desonra à sua santa majestade, como se fosse indiferente com relação à virtude ou ao vício, e desconsideração da nossa irreverência ou rebelião contra a sua autoridade. O apóstolo declara que "todo o mundo tornou-se culpado diante de Deus," o que torna imputável os seus crimes e sujeito ao julgamento de Deus. O ato do pecado é transitório, e o prazer desaparece, mas a culpa, se não perdoada e purgada, permanece para sempre nos registros da consciência. "O pecado de Judá está escrito com um ponteiro de ferro e com a ponta de diamante, está esculpido nas tábuas do coração." Quando os livros da vida eterna e da morte forem abertos no último dia, todos os pecados não perdoados dos homens, com suas agravantes mortais, serão registrados por escrito em caracteres indeléveis, e serão colocados em ordem diante de seus olhos, para a sua confusão: "o justo Juiz jurou que ele não esquecerá nenhuma das suas obras." De acordo com o número e a atrocidade de seus pecados, a sentença deve passar sobre eles: não haverá desculpas que possam suspender o juízo, nem mitigar a execução imediata do mesmo.
O perdão dos pecados contém a abolição de sua culpa e a liberdade da destruição consequente
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merecida por eles. Isto é expressado por vários termos na Escritura. O perdão se relaciona com algum dano e ofensa nos quais a parte ofendida pode severamente reivindicar o seu direito. Agora, embora o bendito Deus, falando estritamente, não possa receber qualquer dano por criaturas rebeldes, sendo infinitamente superior à impressão do mal, ainda que, como diz o nosso Salvador de alguém que olha para uma mulher com desejo impuro, que cometeu adultério com ela em seu coração, embora a inocência da mulher seja imaculada, de modo que os pecados dos homens, sendo atos de ingratidão contra a sua bondade, e notória injustiça contra a sua autoridade, são em um certo sentido prejudiciais a ele, e assim pode exercer justamente vingança sobre eles, mas a sua misericórdia os poupa. O "não imputar o pecado" é apagado das contas dos servidores com seus mestres, e implica a conta que somos obrigados a saldar com o supremo Senhor por todos os benefícios dos quais temos tão miseravelmente abusado. Ele pode justamente exigir de nós os dez mil talentos que lhes são devidos, mas ele, graciosa e prazerosamente risca a nossa dívida em seu livro, e livremente nos desobriga da dívida que temos para com ele. A "purificação do pecado", implica que ele é muito odioso e ofensivo aos olhos de Deus, e tem uma relação especial com os sacrifícios expiatórios, dos quais se diz, que "sem sangue não há remissão." Isso era típico do precioso
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sangue do Filho de Deus que purifica a consciência "de obras mortas”; da culpa do pecado mortal que crava a consciência do pecador. Através da aplicação do seu sangue a culpa carmesim é lavada, e o pecador perdoado é aceito como alguém puro e inocente.
2. Vou demonstrar a seguir, que o perdão pertence a Deus. Isso será evidente pelas seguintes considerações.
1. É a elevada e peculiar prerrogativa de Deus perdoar o pecado. Sua autoridade fez a lei, e dá vida e vigor a ela, portanto, ele pode remir a punição do ofensor. Isto é evidente a partir da proporção das leis humanas, pois, embora os juízes subordinados tenham apenas um poder limitado, e devam absolver ou condenar de acordo com a lei, contudo, o juiz soberano pode revogar suas decisões. Isto é declarado nas Escrituras pelo próprio Deus: "Eu, eu sou aquele, que apago as tuas transgressões por amor do meu nome”, Isa 43. Ele repete isto com ênfase. Ele é proclamado com este título real, “o Senhor clemente e misericordioso, que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado." É uma dispensação da soberania divina perdoar o culpado.
Isto é verdade - o perdão a Deus como um pai, de acordo com a promessa graciosa: “poupá-los-ei como um homem poupa a seu filho que o
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serve.”, Malaquias 3.17, mas isto é feito com a dignidade da sua soberania. Nosso Salvador nos dirige, na perfeita forma de oração ensinada aos seus discípulos a orarem a Deus para o perdão dos nossos pecados, como “nosso Pai que está no céu" em um trono elevado, de onde ele pronuncia o nosso perdão. Sua majestade é gloriosa com sua misericórdia nessa bendita dispensação. Sua supremacia real é mais visível no exercício da misericórdia para com os pecadores arrependidos, do que em atos de juízos sobre criminosos obstinados. Como um rei é mais um rei por perdoar os suplicantes humildes pela operação de seu cetro, do que subjugar os rebeldes pelo poder da espada; porque nos atos de graça, ele está acima da lei, e anula o seu rigor, e nos atos de vingança ele somente está acima dos seus inimigos.
É prerrogativa peculiar de Deus perdoar o pecado. O profeta reputa todas as divindades criadas pelos pagãos como defeituosas quanto a este poder real: "Quem é Deus semelhante a ti, que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado?”, Miqueias 7. O que os fariseus disseram é verdade, “Quem pode perdoar pecados senão Deus?". Porque isto é uma prerrogativa de um imperador absoluto, como somente Deus o é. O poder judicial para o perdão é uma flor inseparável da coroa, porque está fundado numa superioridade à lei, portanto, incompatível com uma autoridade subordinada.
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A criatura é assim incapaz, e está muito longe de ter a supremacia de Deus para perdoar o pecado, bem como da Sua onipotência para criar o mundo, porque ambos são verdadeiramente infinitos. Além disso, o poder de perdoar pecados, implica necessariamente um conhecimento universal das mentes e dos corações dos homens, que são as fontes de suas ações, e conforme a inclinação deles para o bem ou para o mal moral aumenta. Quanto mais deliberada e intencionalmente um pecado é cometido, o pecador incorre numa maior culpa, e requer uma punição mais pesada. Agora, nenhuma criatura pode mergulhar no coração dos homens: "eles estão nus e abertos ao olhar penetrante de Deus.” Adicione ainda mais isto: o poder de autoridade para perdoar, tem, necessariamente anexada, a potência ativa de dispensar recompensas e punições. Agora, somente o Filho de Deus "tem as chaves da vida e da morte em suas mãos."
Pode ser objetado que o nosso Salvador declara que "o Filho do Homem tem poder para perdoar pecados.” A resposta para isso ficará clara ao se considerar que há duas naturezas em Cristo, a natureza divina, que originalmente pertence a ele, e é própria à sua pessoa; e a natureza humana, que é como se fosse adotiva, e foi assumida voluntariamente. Agora, a pessoa divina é o único princípio e sujeito desta dignidade real, mas o perdão é exercido em sua
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conjunção com a natureza humana, e atribuído ao Filho do homem, com base na humilhação de Cristo, os princípios de seus sofrimentos, e os sofrimentos reais, que existem somente na natureza humana, mas por conta da união pessoal eles são atribuídos à pessoa divina, pos se diz: "o Senhor da glória foi crucificado", e "o sangue de Deus" resgatou sua igreja.
A igreja de Roma, com alta presunção, arroga para seus sacerdotes um poder judicial de perdoar os pecados, e pela fácil insensatez e ingenuidade das pessoas, e o engano de seus instrutores, exerce uma jurisdição sobre a consciência. Para evitar a imputação de blasfêmia, eles afirmam que há um duplo poder de perdoar, um supremo e outro subordinado, o primeiro pertence a Deus, e o outro é delegado por comissão para os ministros do evangelho. Mas isso é uma contradição irreconciliável: o poder de perdoar é uno e flui de supremacia, e é incomunicável ao homem. Um príncipe que investe uma outra pessoa com um poder absoluto para perdoar, deve renunciar à sua soberania.
Nenhum homem tem recebido portanto, poder supremo de Deus para pronunciar e dispensar perdão, porque não têm nenhuma autoridade judicial, pois não é presumível que o Deus sábio invista homens com uma autoridade que eles são absolutamente incapazes de exercer.
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(A concessão ou retenção de pecados que nosso Senhor atribuiu a toda a igreja, tem em vista tão somente a aplicação da disciplina para a recepção ou afastamento da comunhão dos santos, pelo arrependimento demonstrado, no primeiro caso, e pela obstinação por permanecer no pecado, para o segundo. (Mateus 18; João 20.23).
Evidentemente, está excluída disto a capacidade para absolvição do erro e para a remoção da culpa, até mesmo porque, não há quem não seja pecador aos olhos de Deus, e que não necessite também de ser perdoado por ele.
Isto é evidente para qualquer um que tenha o Espírito Santo habitando nele, para lhe instruir para discernir corretamente este assunto.
Mas quando não se tem o Espírito e não se é guiado por ele, qualquer um pode afirmar ter poderes que não possui e que são exclusivos de Deus.
E uma incorreta interpretação do significado das palavras de nosso Senhor atribuir a si mesmo a qualificação de mediador entre Deus e o pecador, quando na verdade é afirmado expressamente nas Escrituras que há somente um Mediador para reter ou perdoar pecados, que é nosso Senhor Jesus Cristo. (I Tim 2.5) Isto é prerrogativa exclusiva dEle, e assim, nem
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mesmo a Igreja como um todo a possui, e nem mesmo os seus prelados. Nenhum sacerdote, pastor, presbítero, diácono, profeta, mestre, possui a citada autoridade, nem isoladamente, e nem em grupo.
Isto não é sequer uma prerrogativa de lideranças da Igreja, porque quando nosso Senhor e os apóstolos se referem à Igreja, isto é sempre aplicado a todo o corpo de cristãos que se reúnem nas diversas congregações locais, e cabe a todos os que estão em comunhão deliberar quanto aos assuntos relativos à disciplina ou ao interesse de todo o corpo de Cristo, como vemos por exemplo em Atos 15.22 e Mateus 18.17.
Os que são constituídos como bispos (supervisores, líderes) sobre o rebanho do Senhor não devem deliberar qualquer assunto de interesse da igreja, aparte da participação e aprovação da mesma – nota do tradutor).
2. Deus está pronto a perdoar. O poder de perdoar sem uma inclinação para isto, não oferece qualquer alívio para as agonias de uma consciência acusada, e para os terrores do juízo eterno. A vontade misericordiosa de Deus declarada em sua palavra, é o fundamento da nossa bendita esperança, e nos encoraja em nossos pedidos diante do seu trono: "Pois tu, Senhor, és bom e compassivo; abundante em
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benignidade para com todos os que te invocam.” Sl 86.5.
O atributo do qual o perdão é uma emanação, é geralmente expresso por graça e misericórdia. Diz-se, a "graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens, pela graça sois salvos”. Graça significa favor livre. Existe a este respeito uma diferença entre amor e graça. O amor pode ser definido num objeto digno dele. O objeto principal do amor de Deus é ele próprio, cujas excelentes perfeições são dignas de amor infinito. O amor de pais por filhos é um dever mais claramente natural, mas a graça exclui todo o mérito e dignidade, e toda a obrigação da pessoa que a manifesta. Ainda mais a graça de Deus é exercida sem um motivo em nós que a mereça.
A graça de Deus pode ser considerada como tendo sido exercida em nossa criação e na nossa redenção. Na criação era absolutamente livre, porque os anjos e os homens não existiam antes, e havia apenas um modo de serem trazidos à existência. Agora, não pode haver qualquer mérito antes de sua existência. É verdade, a bondade é glorificada e coroada por comunicação: o mundo é um fluxo brilhante da glória divina, mas não diminui a bondade livre do Criador. Não houve restrição em Deus para fazer o mundo para a Sua glória; porque sua glória essencial é verdadeiramente infinita, e
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não depende de aparência externa para ser tornada completa. A igreja universal paga humilde homenagem ao grande Criador, "reconhecendo que, para seu prazer e vontade todas as coisas foram criadas."
A bondade divina para com os anjos e os homens em sua pureza original, era graça, porque embora a imagem de Deus brilhando neles fosse motivo para a sua aprovação e aceitação, ainda assim, não mereciam nenhum benefício dele: há uma distância e desproporção muito infinitas entre Deus e as criaturas, que não podem, por um direito comum reivindicar qualquer coisa como dever de sua majestade. Além disso, ele é a causa produtiva e conservadora de todas as suas faculdades ativas, e a eficácia das mesmas.
A criação da bondade de Deus é eclipsada na comparação com a sua graça salvadora. A primeira pressupõe nenhuma deserção do seu favor, mas isso pressupõe nossas más deserções: a primeira era livre, mas misericordiosa e curativa graça. A misericórdia nos reaviva e nos restaura quando estamos em miséria. Esta graça e misericórdia é de tão pura natureza, que as inclinações humanas mais ternas para aliviar os aflitos, são misturadas com autointeresses em comparação com a misericórdia de Deus para conosco. Nossas entranhas se comovem e nossas afeições se
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manifestam com a visão de pessoas em miséria profunda. Mas há um constrangimento interior e involuntário da natureza que excita sentimentos ressentidos, e nossa compaixão é movida pela reflexão sobre nós mesmos, considerando que nesse estado estamos sujeitos a muitas tristezas e mágoas, mas Deus é infinitamente livre de toda paixão perturbadora, e isento de todos os males possíveis. Para representar o imenso amor e a misericórdia de Deus em suas circunstâncias cativantes, e para demonstrar sua disposição de perdoar, devemos considerar o que ele fez com o propósito de perdoar pecadores.
1. Se considerarmos Deus como legislador e juiz supremo do mundo, como o protetor da justiça e da bondade, e o vingador de todas as desordens de seu governo moral, isto o leva a não perdoar os pecadores sem que o pecado seja punido de uma maneira que possa satisfazer à sua justiça ofendida, e vindicar a honra de sua lei desprezada, e declarar mais convincentemente seu ódio contra o pecado. Agora, para esses grandes objetivos, ele decretou enviar seu Filho do seu seio, para assumir a nossa natureza, e sofrer a terrível calamidade da morte de cruz, para fazer a propiciação pelos nossos pecados. Este foi o planejamento de sua sabedoria, que os anjos mais esclarecidos não chegaram a ter noção disto. Agora, pode haver uma evidência mais
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real, clara e convincente de que Deus está pronto para perdoar os pecados, do que a dar o seu Filho unigênito, a pessoa tão elevada e querida, o herdeiro de seu amor e glória, para ser um sacrifício, para que ele pudesse nos poupar? Nesta dispensação, o amor foi o atributo principal regente, para que a sua sabedoria, justiça e poder ficassem a ele subordinados: eles estavam em exercício para uma ilustração mais gloriosa da sua misericórdia. Nós temos o mais forte argumento do amor de Deus na morte de seu Filho, para que o nosso perdão fosse o fim disto. A partir daí, é evidente que Deus está mais disposto a dispensar sua misericórdia redentora, do que os pecadores estão para recebê-la.
2. A prontidão de Deus para perdoar apela nos termos graciosos e fáceis prescritos no evangelho para a obtenção do perdão.
Há duas maneiras de justificação diante de Deus, e elas são como dois caminhos de uma cidade: um é direto e curto, mas profundo e intransponível, o outro encontra-se em um circuito, mas vai trazer uma pessoa segura para o local. Assim, há uma justificativa de uma pessoa que se assegura pelas obras, que se prende à imposição da lei, e uma justificação do pecador pela fé em nosso todo-suficiente Salvador. A primeira era um caminho curto para
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o homem, no estado de integridade; a segunda, tal é a distância entre os termos, que tem que ser usada uma bússola. Há uma passagem mais curta da vida para a ação, do que da morte para a vida. Não há esperança ou possibilidade de nossa justificação legal. Diz o apóstolo, "aquilo que a lei não poderia fazer no que estava enferma pela carne, Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança da carne do pecado, e pelo pecado, condenou o pecado na carne.", Rom 8. A expiação do pecado, e a nossa renovação à imagem de Deus, são obtidas por meio do evangelho. A lei é chamada, "a lei do pecado e da morte", o que deve ser entendido não como considerado em si mesmo, como sendo a lei de Deus, mas relativamente à nossa natureza depravada. A lei supõe os homens em um estado de natureza não corrompida, e foi dada para ser um preservativo da nossa santidade e felicidade, e não um remédio para nos recuperar do pecado e da miséria. Ela era uma diretriz do nosso dever, mas desde nossa rebelião a vara é transformada numa serpente. A lei é dura e imperiosa, severa e inexorável, o seu teor é este, "faça ou morra para sempre”. Ela exige uma justiça completa e sem mácula, aquilo que aquele que é nascido em pecado não pode produzir no tribunal de julgamento. O homem é totalmente incapaz, por seus poderes caducos, de recuperar o favor de Deus, e para cumprir sua obrigação pela obediência à lei. Mas o evangelho descobre um caminho aberto,
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fácil para a vida, para tudo o que se referir à salvação pelo Redentor. O apóstolo expressa a diferença entre a condição da lei e do evangelho de uma forma muito significativa. Moisés descreve a justiça que é da lei, de que o homem que faz estas coisas viverá por elas, mas a justiça que vem da fé fala desta maneira: “Mas a justiça decorrente da fé assim diz: Não perguntes em teu coração: Quem subirá ao céu?, isto é, para trazer do alto a Cristo; ou: Quem descerá ao abismo?, isto é, para levantar Cristo dentre os mortos. Porém que se diz? A palavra está perto de ti, na tua boca e no teu coração; isto é, a palavra da fé que pregamos. Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo.”, Rom 10.6-9. O que o apóstolo quer dizer é que é que as coisas acima no céu, ou nas profundezas abaixo, são de descoberta e realização impossíveis, por isso é igualmente impossível ser justificado pelas obras da lei. O pecador ansioso procura em vão por justiça na lei, que somente pode ser encontrada no evangelho.
Pode-se objetar que a condição da lei, e a condição do evangelho, comparadas relativamente às nossas faculdades corrompidas, são igualmente impossíveis. A mente e as afeições carnais, são assim avessas a se arrepender e receber a Cristo como nosso Senhor e Salvador, assim como em relação à
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obediência da lei. Nosso Salvador diz aos judeus, "mas não quereis vir a mim para que tenhais vida, e ninguém pode vir a mim se o Pai não o trouxer." Estas palavras são altamente expressivas de nossa total impotência para acreditar na salvação em Cristo. Mas há uma resposta clara a essa objeção, a diferença entre as duas dispensações consiste principalmente no seguinte: a lei exige obediência total e constante como a condição de vida, sem dar o menor poder sobrenatural para realizá-lo. Mas o evangelho tem o espírito de graça concomitante com ele, os pecadores por essa eficácia onipotente são revividos, e habilitados para cumprir os termos da salvação. O espírito da lei é denominado o espírito de escravidão por seus efeitos rigorosos; ela descobriu o pecado, e aterrorizou a consciência, sem a implantação de um princípio de vida que possa restaurar o pecador a um estado de santa liberdade. Como o fogo no mato fez os espinhos nele visíveis, sem consumi-los, assim o fogo da lei descobre os pecados dos homens, mas não os remove, mas "a lei do Espírito da vida em Cristo Jesus, isto é, o evangelho, nos libertou da lei do pecado e da morte."
Eu vou mais particularmente considerar os termos graciosos prescritos no evangelho para a obtenção de perdão; "Arrependimento para com Deus e fé no Senhor Jesus Cristo." A necessidade deles não é uma constituição arbitrária, mas
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fundada na natureza imutável das coisas. Arrependimento significa uma mudança sincera da mente e do coração do amor às práticas do pecado, para o amor e à prática da santidade, com base em motivos evangélicos e divinos. Os principais ingredientes nisto são, reflexões com tristeza e vergonha sobre os nossos pecados passados, com resoluções firmes para uma futura obediência. Isto é um princípio vital produtivo de frutos adequados para ele (arrependimento): ele é chamado de "arrependimento de obras mortas, o arrependimento para a vida." É a semente de uma nova obediência. O arrependimento na ordem de natureza é anterior ao perdão, mas eles estão inseparavelmente unidos no mesmo ponto do tempo. Davi é um exemplo abençoado disto: "Confessei-te o meu pecado e a minha iniquidade não mais ocultei. Disse: confessarei ao Senhor as minhas transgressões; e tu perdoaste a iniquidade do meu pecado.", Sl 32.5. A súmula e o teor da comissão do apóstolo registrada por Lucas é, "o arrependimento e a remissão dos pecados deve ser pregado em nome de Cristo a todas as nações." Lucas 24. Que somente um pecador arrependido está qualificado para o perdão, será evidente ao considerarmos,
(1) Que um pecador impenitente é o objeto de vingança e juízo; e é então absolutamente inconsistente que a misericórdia perdoadora e o
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juízo vingativo devam ser aplicados à mesma pessoa, ao mesmo tempo, e no mesmo sentido. Diz-se: "o Senhor odeia todos os que praticam a iniquidade, e sua alma odeia o ímpio." A expressão indica graus intensos de ódio. Quando da gloriosa aparição de Deus a Moisés, quando proclamou com os mais altos títulos de honra: "O Senhor Deus, clemente e misericordioso, que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado", isto é adicionado, “ele não inocenta o culpado", isto é, os pecadores impenitentes. Devemos supor que Deus seja de natureza mutável flexível, (que é uma imaginação blasfema, e faz com que ele goste do homem por ser ele pecador) a ponto de um pecador impenitente poder ser recebido sem buscar uma mudança em sua disposição. Deus não pode se arrepender de dar uma santa lei, a regra do nosso dever, portanto, o homem deve se arrepender de sua violação da lei antes que ele possa se reconciliar com Deus. A verdade é que o homem considerado apenas como um pecador não é objeto da misericórdia de Deus, isto é, de piedade e compaixão, pois como tal, ele é objeto da ira de Deus, e é uma contradição formal afirmar que ele é objeto do seu amor e ódio ao mesmo tempo. Mas o homem, considerado como criatura de Deus, envolvido na miséria pela fraude do tentador, e sua própria loucura, era o objeto da compaixão de Deus, e a recuperação dele de seu estado miserável abandonado, foi o efeito desta compaixão.
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(2) Apesar de a misericórdia ser considerada como um atributo separado ela pode perdoar um pecador impenitente, mas não em conjunto e harmonia com as perfeições essenciais de Deus. Muitas coisas são possíveis de serem absolutamente consideradas, quanto ao que Deus não pode fazer, porque o seu poder é sempre dirigido em seu exercício, pela sua sabedoria, e limitado pela sua vontade. Seria menosprezar a sabedoria de Deus, manchar sua santidade, violar a sua justiça, perdoar um pecador impenitente. O evangelho com a promessa de perdão para tal, seria frustrado no seu objetivo principal, que é para “nos purificar de toda a iniquidade, e fazer de nós um povo zeloso de boas obras."
(3) Se um pecador impenitente pode ser perdoado como tal, ele pode ser glorificado: pois o que qualifica um homem em busca de perdão, o qualifica para a salvação, e o decreto divino estabelece uma ligação inseparável entre eles, "a quem Deus justifica, ele glorifica”, Rom 8.30. Neste caso suposto, se um pecador morre imediatamente após ter recebido o seu perdão, nada pode impedir de ser recebido no céu. Agora isso é totalmente impossível, pois sem santidade ninguém verá a Deus. A admissão de um pecador impenitente no céu poluiria o lugar santo, e removeria a consagração do templo de Deus, onde sua santidade brilha em sua glória.
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É contestado por alguns, que o arrependimento que é requerido para qualificar o pecador para o perdão ofusca a graça do evangelho. Mas esta pressuposição é mal fundamentada e mal-orientada neste assunto. Isso será evidente, considerando:
Que o arrependimento é uma graça evangélica, o dom do Redentor: “Deus, porém, com a sua destra, o exaltou a Príncipe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento e a remissão de pecados.”, Atos 5.31. A lei não continha o arrependimento, nem a promessa do perdão para a salvação. O desígnio da lei era o de nos manter no favor e comunhão com Deus, mas não proporcionava qualquer meio de reconciliação após que o ofendêssemos. O arrependimento não tinha o menor grau na perfeição do homem antes da sua queda, mas é um alívio para a sua imperfeição depois. A lei chama os justos para a obediência, o evangelho chama os pecadores ao arrependimento.
Que não há causalidade ou mérito no arrependimento para obtermos o nosso perdão. A misericórdia de Deus por causa dos mais preciosos méritos e mediação de Jesus Cristo é a única causa do perdão. Uma torrente de lágrimas de arrependimento, uma efusão de nosso sangue, são de um preço muito baixo para fazer qualquer satisfação a Deus, e para merecer um retorno ao seu favor. O amor mais sincero de
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santidade e firme resolução de abandonar o pecado, que é a parte principal de nosso arrependimento, pode satisfazê-lo quanto às nossas ofensas passadas, pois é dever natural do homem perante a prática do pecado: o arrependimento é apenas uma qualificação vital no assunto que se refere ao perdão.
Que é muito óbvia a graça de Deus em conceder perdão, em conformidade com a ordem do evangelho para os pecadores arrependidos. Porque primeiro, o arrependimento torna a misericórdia divina mais honrosa na estima daqueles que participam dela. Nosso Salvador nos diz que: "não precisam de médico, senão aqueles que estão doentes." Aquele que sente a sua doença, e está fortemente apreensivo com o seu perigo, valoriza o conselho e a assistência de um médico acima de todos os tesouros. O pecador arrependido que está sob a forte convicção de sua culpa, e do seu constante desagrado a Deus, e a consequência da miséria eterna que disso decorre, valoriza o favor de Deus como o bem mais soberano, e considera seu descontentamento como o mal supremo. O arrependimento inspira afetos ardentes em nossas orações e louvores pelo perdão. O pecador arrependido ora para o perdão com tanto fervor como Daniel orou na cova, para ser preservado dos leões devoradores, ou como Jonas orou do ventre do inferno por libertação. Ele não se dirige a Deus com desejos fracos, mas
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com desmaios por misericórdia, "Dê-me o perdão, ou eu morro.", Jonas 2. O pecador insensível que está seguro na sombra da morte, pode oferecer alguns pedidos verbais para o perdão, mas a sua oração é defeituosa no princípio, porque ele nunca sente a sua necessidade de perdão; ele ora tão friamente como se fosse indiferente se ele será aceito ou não. E com que êxtase de admiração e alegria, e sentimentos de gratidão, o penitente perdoado exalta a misericórdia divina? A mulher na casa do fariseu Simão se derretia em lágrimas de arrependimento, porque ela “amava muito, porque foi muito perdoada.”
Esta afirmação de que o arrependimento qualifica um pecador para o perdão, é mais benéfica para o homem, e, consequentemente, mais ilustra o perdão da misericórdia. Devemos observar, que o pecado não somente nos afeta com a culpa, mas deixa uma corrupção inerente, que contamina e degrada o pecador, e ele se inclina fortemente para a recaída na rebelião. Agora o arrependimento dá a verdadeira representação do pecado em suas consequências penais, a ira do Todo-Poderoso, os terrores de consciência, e torna isto evidente e odioso para a alma. Davi teve uma convicção aguda da grave falta que era um pecado de adultério, quando seus "ossos foram quebrados." O arrependimento em tristeza ataca a raiz do pecado, a saber, o amor pelo prazer. Isso nos faz
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temerosos de ofender a Deus, e nos faz fugir de todas as tentações sedutoras que nos atraiam para pecar. Isso nos faz obedientes. O metal derretido é receptivo a qualquer forma. A contrição é acompanhada com resignação: "Senhor, que queres que eu faça”, foi a voz de arrependimento de Saulo.
Pode ser objetado isto que lemos: "Deus justifica o ímpio", mas a resposta é clara. O apóstolo não tem a intenção de um ímpio, um pecador impenitente, mas apresenta a diferença entre o ímpio e alguém que obedece perfeitamente a lei, e é, consequentemente, justificado pelas obras, e, neste sentido, os mais excelentes santos aqui são ímpios. Além disso, o apóstolo não afirma que Deus absolutamente perdoa o ímpio, mas qualifica as pessoas: “Porque aquele que não pratica, mas crê naquele que justifica o ímpio, sua fé lhe é imputada como justiça.” Agora, justificado, a fé e o arrependimento são como gêmeos; o arrependimento é o primeiro sentimento, e então a fé opera na aplicação dos méritos da morte de Cristo para o nosso perdão.
É perguntado por alguns, se toda a graça é comunicada a partir de Cristo, como a nossa cabeça, supõe a nossa união com ele, de quem a fé é a parte vital e, consequentemente, a primeira graça, através da qual todas as outras graças são derivadas para nós.
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A isso respondo, existem dois meios de nossa união com Cristo: o principal é o espírito vivificante descendente de Cristo como a fonte da vida sobrenatural, e uma fé viva operada em nós pelo sua operação pura e poderosa, que parte de nós e se une com ele. Diz-se, que o segundo Adão, foi feito "um espírito vivificante", e que aquele que se une "ao Senhor é um espírito com ele". Como as partes do corpo natural estão unidas pela influência vital da mesma alma que está presente em todo o corpo, de modo que estamos unidos a Cristo pelo Espírito Santo que lhe foi dado sem medida, e de sua plenitude que é comunicada a nós. Está claro, portanto, além de toda contradição, que a fé não é antecedentemente necessária, como o meio de transporte de todas as graças a nós que nos vêm de Cristo.
Há dois atos de fé: o primeiro diz respeito à oferta geral de perdão no evangelho para todos os pecadores arrependidos crentes; o segunda é a aplicação da promessa de perdão para a alma. O primeiro é antecedente ao arrependimento evangélico; o segundo é claramente consequente na ordem natural, pois a promessa assegura o perdão somente aos "cansados e oprimidos que vierem a Cristo para receber o descanso.”
Em suma, não há um acordo perfeito e simpatia entre a razão e a revelação divina nesta doutrina,
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que somente Deus perdoa o pecador arrependido. A afirmação contrária é uma anulação da retidão da sua natureza, e diretamente contrária ao projeto e teor do evangelho. Se um homem pode ser justificado como ímpio, o mandamento evangélico de arrependimento para a remissão dos pecados é inútil e sem proveito. Que pode haver uma influência perniciosa sobre a prática desta doutrina, é óbvio para qualquer um que considerar isso. Eu somente adiciono o seguinte: se Deus perdoa os homens como ímpios, “Como ele julgará o mundo?" Foi profetizado por Enoque, "Eis que o Senhor vem com dez mil santos para julgar todos os ímpios por suas obras de impiedade, que têm impiamente cometido.” Agora, como o apóstolo Tiago argumenta contra a perversidade dos homens, "quando da mesma boca procede a bênção e a maldição; porventura pode a fonte jorrar águas doce e amarga?” Tg 3.10. Esta instância é incomparavelmente mais forte no que diz respeito a Deus do que aos homens. É mais consistente e concebível que uma fonte manasse água doce e salgada, de que o Deus santo e justo, em cuja natureza não há a menor discórdia, deva justificar alguns como ímpios, e condenar os outros como ímpios para sempre.
A fé no Senhor Jesus Cristo é a condição evangélica da obtenção do nosso perdão. Isso aparecerá, considerando a natureza da fé. A fé
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salvadora é uma convicção sincera do poder e desejo de Cristo para salvar os pecadores, que induz a alma para recebê-lo, e a confiar nele, pois ele é oferecido no evangelho. Nós temos a certeza de sua autossuficiência e da sua vontade compassiva para nos salvar; “Ele é capaz de salvar perfeitamente a todos os que vêm a Deus por ele." Nosso Salvador declara: "Quem vier a mim, de modo nenhum o lançarei fora." A fé está assentada na alma, e em conformidade com a verdade e a bondade transcendente do objeto, produz a estima mais preciosa e sagrada disto na mente, e o mais alegre consentimento e escolha disto na vontade.
Assim, um crente sincero abraça inteiramente a Cristo como "um Príncipe e Salvador", e está muito disposto a ser governado por seu cetro, a depender de seu sacrifício. A aceitação e a confiança são os ingredientes essenciais da fé justificadora. Esta é a doutrina do evangelho eterno. O anjo o declarou aos pastores: "Eis que vos trago novas de grande alegria, que será para todo o povo, porque vos nasceu hoje, na cidade de Davi, o Salvador, que é Cristo, o Senhor.", Lucas 2.10. "Esta é uma palavra fiel, e digna de toda aceitação, que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal.", 1 Tim 1.15.
A fé é indispensavelmente necessária para a obtenção do nosso perdão. A fé é o canal em que
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as questões preciosas de seu sangue e sofrimentos são encaminhados para nós.
Para tornar mais evidente o quão necessária e graciosa é uma condição de fé no Redentor, para o nosso perdão, vou considerar brevemente o fundamento do pacto de vida no evangelho:
Depois que o homem mergulhou em condenação, visto que Deus decretou que, sem satisfação da sua justiça não deve haver remissão de seus pecados, e o pecador totalmente incapaz de suportar tal punição em graus, como deve, para ser verdadeiramente satisfatória, necessariamente se segue, que ele deve sofrer uma punição equivalente em duração. Para evitar isso, não havia nenhuma maneira possível, mas ao admitir a fiança, quem deveria representar o pecador, e em seu lugar sofrer o castigo devido ao pecado. Um tríplice consentimento era necessário nesta transação.
(1) O consentimento do soberano, cuja lei foi violada, e sua majestade desprezada, para que haja uma distinção natural entre pessoas e entre as ações de pessoas, assim, deve haver entre as retribuições dessas ações; consequentemente o pecador é obrigado a sofrer a punição em sua própria pessoa. A partir daí, é claro, que a punição não pode ser transferida para outro sem a permissão do soberano, que é o patrono dos direitos da justiça.
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(2) O consentimento do fiador é requisitado: porque a punição sendo uma emanação de justiça não pode ser infligida a uma pessoa inocente, sem a sua apresentação voluntária para salvar o culpado. A fiança é legalmente uma pessoa com o devedor, caso contrário o credor não pode executar a ação, pela regra de direito, o pagamento pelo fiador, que é fixado pela lei sobre a pessoa do devedor.
(3) Isto é também claro, que o consentimento do culpado é necessário, que obtenha a impunidade pelos sofrimentos vicários de outro. Porque, se ele resolve levar a sua própria culpa, e deliberadamente se recusa a ser liberado pela apresentação de outro entre ele e a punição, nem o juiz nem o fiador podem obrigá-lo. Agora, todos estes concorrem nesta grande transação. Como a criação do homem foi uma obra de conselho solene: "Façamos o homem", por isso a sua redenção foi também o produto do conselho divino. Eu posso aludir ao que nos é representado na visão da glória divina ao profeta Isaías: "Depois disto, ouvi a voz do Senhor, que dizia: A quem enviarei, e quem há de ir por nós? Disse eu: eis-me aqui, envia-me a mim.”, Isa 6.8. Assim, o levantar a nossa salvação foi do Pai. Ele faz a pergunta, quem deve ir por nós, para recuperar o homem caído? O Filho se apresenta, "Aqui estou, envia-me". O Pai em sua soberania e misericórdia nomeia e aceita o mediador e fiador para nós. Não fazia parte da lei
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dada no paraíso, que se o homem pecasse, ele deveria morrer, ou o seu fiador no seu lugar, mas foi um ato do livre poder de Deus como superior à lei, para nomear o seu Filho para ser o nosso avalista, e morrer em nosso lugar.
Diz-se no Evangelho: "Deus amou tanto o mundo”, então acima de toda, comparação e compreensão, ele deu e enviou seu Filho unigênito ao mundo, para que o mundo através dele pudesse ser salvo. O Filho de Deus, com a escolha mais livre, se interpôs entre o Deus justo e o homem culpado para esse fim. Ele voluntariamente deixou seu trono soberano no céu, eclipsou sua glória sob uma nuvem escura da carne, degradando-se na forma de um servo, e submetendo-se a uma morte ignominiosa e cruel para a nossa redenção. Quando ele veio ao mundo, ele declarou seu pleno consentimento, com uma nota de eminência: "Sacrifício e oferta não quiseste, mas um corpo tu tens me preparado, então eu disse: Eis-me aqui para fazer a tua vontade, ó Deus.” Nesse consentimento do Pai e do Filho, toda a estrutura de nossa redenção é construída. A execução da justiça em Cristo é a expiação de nossos pecados, e pelos seus sofrimentos o preço total é pago para nossa redenção. Há uma troca judicial de pessoas entre Cristo e os crentes, a sua culpa é transferida para ele, e a sua justiça é imputada a eles. "Ele o fez pecado por nós, que não conheceu pecado, para que
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nele fôssemos feitos justiça de Deus nele." 2 Coríntios 5. Sua obediência ativa e passiva, sua vida e morte são contadas para os crentes para a sua aceitação e perdão, como se tivessem feito meritoriamente a sua própria salvação.
O pecador deve dar o seu consentimento para ser salvo pela morte de Cristo sobre os termos do evangelho. Esta Constituição é fundamentada sobre os artigos eternos entre o Pai e o Filho no pacto da redenção. Nosso Salvador declara que "Deus deu o seu Filho, para que todo aquele que nele crê, não pereça, mas tenha a vida eterna." Não obstante a plena satisfação feita pelos nossos pecados, tenha sido planejada e executada sem o nosso consentimento, todavia, sem uma fé que se aproprie deste planejamento divino, nenhum benefício poderia advir para nós. "Ele habita em nossos corações pela fé", e é por esta parte vital de nossa união que temos comunhão com ele em sua morte, e em tudo o que respeita a todos os benefícios abençoados por ele adquiridos, como se tudo o que ele fez e sofreu tivesse sido para nós somente. "Ele é a propiciação pela fé no seu sangue." Desse total consentimento do pecador, há um excelente exemplo no apóstolo: ele o expressa com o maior ardor de afeição: “Eu considero tudo como esterco para que possa ganhar a Cristo e ser encontrado nele, não tendo a minha justiça, que é da lei, mas a que vem pela fé em Cristo.", Fp 3.9. Como um pobre devedor
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insolvente, pronto para ser lançado numa prisão perpétua, anseia por uma fiança rica e liberal, para fazer o pagamento para ele; assim o apóstolo Paulo desejava ser encontrado em Cristo, como um fiador todo-suficiente, para que ele pudesse obter a liberdade da acusação da lei.
O estabelecimento do evangelho, do qual a fé é a condição do nosso perdão, de modo que ninguém pode ser justificado sem ela, é por pura graça. O apóstolo apresenta esse motivo pelo qual todas as obras são excluídas - aquelas realizadas no estado de natureza, ou por um princípio de graça - de serem a causa da aquisição da nossa salvação, que é para evitar a vanglória em homens que resultaria disso. "Vocês são salvos pela graça, mediante a fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus." Ef.2. O perdão do pecado é a parte principal de nossa salvação. Ele declara positivamente, que a justificação "é, portanto, da fé, para que seja segundo a graça", Rom 4. Se a justificação fosse obtida por uma condição de execução impossível, isto não teria nenhum favor para oferecer aquele bem-aventurado benefício para nós; senão sendo isto a certeza de um crente que humilde e gratamente o aceita, a graça de Deus é sumamente glorificada. Para tornar isso mais claro, a fé, pode ser considerada como uma graça produtiva, ou receptiva: como produtiva, purifica o coração, trabalha por amor, e nesta
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consideração não somos justificados por ela. A fé não tem eficiência em nossa justificação, isto é o ato exclusivo de Deus, mas a fé como uma graça receptiva, que abraça Cristo com seus preciosos méritos que nos são oferecidos na promessa, nos credencia para o perdão. E deste modo a graça divina é exaltada: porque aquele que depende totalmente da justiça de Cristo, renuncia absolutamente à sua própria justiça, e atribui a obtenção de perdão exclusivamente à misericórdia e ao favor de Deus, por causa do Mediador.
3. Que Deus está pronto a perdoar, está plenamente provado por muitas declarações graciosas em sua palavra, a expressão infalível de sua vontade. "Nós somos ordenados a buscar a sua face para sempre", seu favor e amor, porque o semblante é o espelho em que os afetos aparecem. Agora todos os mandamentos de Deus nos asseguram a sua aprovação e aceitação de nossa obediência a eles; segue-se, portanto, que é muito agradável para ele, que oremos para o perdão de nossos pecados, e que ele vai perdoá-los se orarmos da maneira devida. Quando ele proibiu o profeta Jeremias de orar por Israel, era um argumento de ruína decretada contra eles: "Não rogues por este povo, pois eu não te ouvirei.”, Jer 7.16. Para incentivar a nossa esperança, Deus tem o prazer de nos dirigir em nossos pedidos de misericórdia: ele dirige "Israel, que havia caído
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pela iniquidade, a observar a palavra, e voltar para o Senhor, lhes dizendo: “Perdoa toda iniquidade, aceita o que é bom e, em vez de novilhos, os sacrifícios dos nossos lábios.", Os 14.2. A isto se soma uma solene renúncia dos pecados que o provocaram à ira. Sua resposta graciosa se segue: "Curarei a sua infidelidade, eu de mim mesmo os amarei, porque a minha ira se apartou deles.", Os 14.4. Se um príncipe faz uma petição a um suplicante humilde para si mesmo, é uma forte indicação de que ele irá concedê-lo. Deus une súplicas aos seus mandamentos, para induzir os homens a aceitar essa misericórdia. O apóstolo declara: "De sorte que somos embaixadores da parte de Cristo. Como se Deus suplicasse a vocês por nós, rogo-vos em nome de Cristo que vos reconcilieis com Deus", 2 Coríntios 5. Surpreendente bondade! quão condescendente, quão compassivo! A provocação começou por parte do homem, a reconciliação começou primeiro em Deus. Que o Rei do céu, cuja indignação foi acendida por nossas rebeliões, e com justiça poderia enviar algozes para nos destruir, enviaria embaixadores para nos oferecer a paz, e pedir que sejamos reconciliados com ele, como se fosse o seu interesse e não o nosso, é a misericórdia acima do que podemos pedir ou pensar. Com mandamentos e súplicas ele mistura promessas de perdão para nos encorajar a vir ao trono da graça: "Quem confessa e abandona seus pecados, alcançará
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misericórdia." Esta promessa é ratificada pela garantia ainda mais forte: "Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda injustiça.", 1 João 1. O perdão de um pecador arrependido é o efeito mais livre da misericórdia, mas é devido à honra da fidelidade e da justiça de Deus, que tem o prazer de se comprometer com a sua promessa de fazê-lo. E apesar de a palavra de Deus ser tão sagrada e certa como seu juramento, pois é impossível para ele mudar a sua vontade, ou para nos enganar em ambos, ainda para superar os temores, para aliviar as dores, para nos dar forte alento e satisfazer os desejos dos pecadores arrependidos, ele teve o prazer de anexar seu juramento à promessa, Heb 6.18, o qual é de um caráter mais infalível e, note que a bênção prometida é imutável.
Ele acrescenta ameaças aos seus convites, para que o temor, que é um sentimento ativo e forte, possa nos constranger a procurar a sua misericórdia. Nosso Salvador disse aos judeus que se fizeram cegos e endurecidos em sua infidelidade: "Se não credes que eu sou ele", o Messias prometido, "e não virdes a mim para obter a vida, morrereis nos vossos pecados." João 8.24. O risco implica um estado final e temeroso, além de toda expressão, pois aqueles que morrem em seus pecados, devem morrer por causa deles por toda a eternidade. O inferno é a
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triste mansão das almas perdidas, cheio de ira e desespero extremos, e onde o desespero é sem remédio, a tristeza é sem mitigação para sempre. A partir daí podemos ser convencidos, como Deus está disposto a perdoar e a nos salvar, em saber como estamos enredados com os pecados que nos são agradáveis, ele nos revela qual será a consequência eterna dos pecados para os quais não houve arrependimento nem perdão, a punição acima de todos os males que são sentidos ou temidos aqui embaixo.
Se os homens se submetem ao chamado de sua palavra, e do seu Espírito, e, humildemente, aceitam os termos de misericórdia, isto é muito agradável para ele. Somos certificados por Jesus Cristo, que é verdade, que há "alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento." O próprio Deus declara com um solene juramento, que ele não tem prazer na morte do pecador, mas que se converta e viva. A santidade e a misericórdia de Deus são duas das suas mais divinas perfeições, a sua glória peculiar e prazer. Agora, o que pode ser mais agradável, do que ver uma criatura pecadora conformada com sua santidade, e salva pela sua misericórdia? Se a alegria interior de Deus, pela qual ele é infinitamente bendito, fosse capaz de novos graus, isto exaltaria de forma mais elevada o exercício da sua misericórdia, que
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perdoa. Há uma clara representação disso na parábola do filho pródigo, em seu retorno a seu pai que o recebeu com um roupão e um anel, com música e um banquete, os sinais de alegria são exaltados nisto. Mas, se os pecadores estão endurecidos, na obstinação, e não obstante Deus esteja tão disposto a perdoá-los, são voluntários para serem condenados, com o variedade de paixões que eles expressam em seu ressentimento. Ele assume a linguagem dos homens, para fazê-los compreender a sua afeição por eles. Às vezes, ele protesta com uma terna simpatia, “Por que morrereis?" como se fossem imediatamente cair no abismo. Ele expressa piedade, misturada com indignação, pela sua louca escolha e ruína; “Até quando, ó néscios, amareis a necedade? E vós, escarnecedores, desejareis o escárnio? E vós, loucos, aborrecereis o conhecimento?" (Pv 1.22). Que relutância e remorso ele expressa contra proceder aos juízos extremos? “Como te deixaria, ó Efraim? Como te entregaria, ó Israel? Como te faria como a Admá? Como fazer-te um Zeboim? Meu coração está comovido dentro de mim, as minhas compaixões, à uma, se acendem.”, Os 11.8.. Com que compaixão o Filho de Deus anunciou a destruição decretada de Jerusalém, por rejeitar o Salvador e a salvação! "e dizia: Ah! Se conheceras por ti mesma, ainda hoje, o que é devido à paz! Mas isto está agora oculto aos teus olhos.”, Lc 19.42. Como um juiz
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que se compadece do homem, quando ele condena o malfeitor.
Aqueles que interpretam algumas expressões das Escrituras, de que "Deus ri da calamidade dos ímpios, e zomba quando o medo vem,” Pv 1.26, e é inexorável para as suas orações, em tal sentido, maiores são as expressões da graça de Deus, para induzir os pecadores a se arrependerem e crerem para a sua salvação; chamam a escuridão de luz, porque as ameaças são dirigidas contra os rebeldes obstinados que frustram os mais poderosos métodos da misericórdia, e rejeitam a chamadas de Deus, no dia da sua graça, e por meio de retribuição, suas orações são ineficazes, e rejeitadas, no dia da sua ira.
Que Ele é tão grande e irreconciliavelmente provocado pelo desprezo deles da Sua misericórdia, é uma indicação certa do quão altamente ele teria ficado satisfeito com a humilde aceitação deles da mesma. Que ninguém, então, por uma suspeita vil e miserável, suponha que os repetidos apelos de Deus para os pecadores voltarem a viver, não significam a sua vontade sincera, e diminuam a glória de sua bondade, e blasfemem da sua santidade sem mácula. A excelência da sua grandeza nos assegura da sua sinceridade. Por que a gloriosa Majestade da coorte do Céu deveria ser desprezada por criaturas que
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necessitam ser reconciliadas? Estamos infinitamente abaixo dele, e nenhuma vantagem pode ser dada a ele por nós. Príncipes temporais podem ser seduzidos pelos juros de enviar declarações falsas a rebeldes armados, para reduzi-los à obediência; mas o que o Altíssimo ganha com nossa submissão ou perde com nossa obstinação? Uma bondade falsificada visa à esperança de algum bem, ou ao temor de algum mal; e de ambos Deus é absolutamente incapaz. Somos todos desagradáveis para a sua justiça severa; não há ocasião em que ele deveria pretender, pela oferta graciosa de perdão, agravar o pecado e a sentença contra quem o recusar. Quem com coração triste e quebrantado, e que sinceramente odeie seus pecados, e procura perdão pelo Mediador, achará em sua experiência o ser poupado pela misericórdia, como asseguram as mais altas expressões disto nas Escrituras, e que excede a todos os seus pensamentos.
4. Inferimos que Deus está pronto para perdoar, por ele ser tão lento para punir. Apesar de todos os atributos divinos serem iguais em Deus, e não haja um acordo completo entre eles, mas há uma diferença em suas operações externas, João declara: "Deus é amor," que significa a sua bondade comunicativa, exercício este que é mais livre e agradável para ele do que os atos de vingança da justiça. “porque não aflige, nem entristece de bom grado os filhos dos homens.”,
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Lam 3.33. Sua misericórdia em dar e perdoar como os fluxos de água de uma fonte; atos de justiça são forjados a partir dele (como o vinho a partir das uvas) pelo peso nossos pecados. No primeiro dia do julgamento, o Salvador foi prometido antes que a maldição fosse determinada, como lemos no início do livro de Gênesis. Não obstante os homens pecadores quebram as suas leis, e pisam sobre ela perante a sua face; eles resistem e entristecem ao seu Espírito; e ainda assim ele retarda a execução do juízo, porque a longanimidade pode levá-los ao arrependimento.
Isso será exibido por considerar que a tolerância de Deus para com os pecadores não é,
1. Por falta de descoberta de seus pecados, a justiça humana pode suportar que uma pessoa culpada escape da punição por falta de provas claras, mas isto não se aplica à justiça do céu. "Deus é luz" no que diz respeito à sua pureza e onisciência. Seus olhos de fogo penetram através das mais densas trevas em que os pecados são cometidos, e todas as artes da dissimulação usadas para cobri-los. Ele vê todos os pecados dos homens, com o olho de um juiz, "E não há criatura que não seja manifesta na sua presença; pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de prestar contas.", Hb 4.13. Por isso
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se diz: "Deus vai exigir o que é passado”, e irá observar o que está por vir, para julgamento.
2. Não se trata de um defeito de Seu poder que os maus são poupados. Grandes príncipes são por vezes impedidos do exercício da justiça, quando a pessoa culpada é apoiada por um partido predominante contra eles, porque o poder de um príncipe não está, em si mesmo, mas naqueles que são seus súditos. Davi foi obrigado a poupar Joabe, após o assassinato de Abner, por causa de sua participação no exército, "os filhos de Zeruia, eram muito duros” para ele, e ele temia sua resistência rebelde. Mas o poder de Deus é inerente em si mesmo, e não depende de qualquer criatura: O Senhor é exaltado em seu próprio poder. Ele não teme ninguém, e deve ser temido por todos. Com um golpe de onipotência, ele pode destruir todos os seus inimigos para sempre. Ele pode, com maior facilidade subjugar os rebeldes mais obstinados, do que podemos respirar. Sua força é igual à sua autoridade, ambas são verdadeiramente infinitas. Os culpados são poupados, por vezes, pela parcialidade viciosa de príncipes aos seus favoritos, ou uma negligência miserável da justiça, mas o alto e santo Rei é, sem acepção de pessoas: ele odeia o pecado com ódio perfeito, e está irritado com o ímpio todos os dias . A Escritura nos dá conta porque a execução é adiada: “O Senhor não retarda o juízo (como alguns o julgam
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demorado), mas é longânimo para com todos, não querendo que ninguém pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento." "Ele espera ser gracioso", e poupa os homens na expectativa da sua salvação.
5. Parece que Deus está pronto a perdoar, em que, após o primeiro sinal de humildade e penitência dos que creem, ele os perdoa presentemente.
Se considerarmos quanto tempo os homens continuam em um curso de pecados, e quanto recusam as ofertas de misericórdia por serem culpados, isto pode justamente ser esperado, que Deus com desdém rejeite as suas petições ou não seja buscado sem um longo exercício de arrependimento, e contínuas, submissas e fervorosas solicitações de sua misericórdia. Mas o Rei do céu não mantém qualquer condição, o "trono da graça" está sempre aberto e acessível a penitentes humildes: quando seus corações estão preparados, seu ouvidos estão inclinados para ouvi-los. Davi, depois de praticar pecados muito desagradáveis, e ter ficado por longo tempo em estado de impenitência, mas no seu quebrantamento quanto à sua maldade, resolveu se humilhar por um reconhecimento triste disto, e ele foi restaurado ao favor divino. "Eu disse que ia confessar os meus pecados, e tu perdoaste a maldade do meu pecado." O arrependimento de Efraim é um
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exemplo admirável das entranhas compassivas de Deus para com os pecadores: “Bem ouvi que Efraim se queixava, dizendo: Castigaste-me, e fui castigado como novilho ainda não domado; converte-me, e serei convertido, porque tu és o Senhor, meu Deus. Na verdade, depois que me converti, arrependi-me; depois que fui instruído, bati no peito; fiquei envergonhado, confuso, porque levei o opróbrio da minha mocidade. Não é Efraim meu precioso filho, filho das minhas delícias? Pois tantas vezes quantas falo contra ele, tantas vezes ternamente me lembro dele; comove-se por ele o meu coração, deveras me compadecerei dele, diz o Senhor." (Jer 31.18-20).
O filho pródigo em sua resolução de regressar ao seu Pai, e considerando a si mesmo como totalmente indigno de ser recebido como um filho, enquanto ele estava no caminho, seu pai o viu à distância, e correu para ele, lançou-se sobre seu pescoço e o beijou, e perdoou a sua rebelião passada inteiramente. O publicano com sua alma ferida disse: “Senhor, sê propício a mim, pecador!”, e foi justificado, e não o fariseu orgulhoso.
6. É um argumento convincente, que Deus está pronto a perdoar o pecado, que ele dá graça aos homens para prepará-los para a sua misericórdia perdoadora. O arrependimento e a fé são plantas sagradas que não brotam da nossa
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terra, mas têm suas raízes no céu. "Deus dá o arrependimento para a vida." Atos 11. "A fé não é de nós mesmos, é dom de Deus." Ef. 2. Em nosso estado corrompido o pecado é natural ao homem, e tem inteiramente possuído todas as suas principais faculdades. "O pendor da carne é inimizade contra Deus", Rom 8. A vontade é rebelde, e fortemente inclinada a paixões sedutoras: as tentações são tão numerosas e deliciosas, que os pecadores se aventuram a ser infelizes para sempre, para desfrutar os prazeres do pecado, que morrem na degustação. É verdade, que tais são as inclinações invioláveis da natureza humana para a felicidade, que nenhum homem pode amar a morte sem disfarces, nem escolher a condenação por si mesmo; ainda o afeto ao pecado é tão soberano, que não irão abandoná-lo até a morte. A sabedoria de Deus nos diz: "aqueles que me odeiam amam a morte", Prov 9. Nosso Salvador reprovou os judeus com compaixão, "mas não quereis vir a mim para terdes vida." João 5. Esta é a causa de sua permanência em um estado de culpa para sempre.
Agora tal é a misericórdia de Deus, que ele dá o seu Espírito, para ajudar os homens por sua iluminação, prevenção, contenção e graça, a abandonar seus pecados, para que possam ser salvos, e se eles melhoraram fielmente os graus mais baixos de graça (embora eles nada possam reivindicar por direito), ele teria de boa vontade
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lhes dado mais graça; mas eles são tão avessos a Deus, e inclinados fortemente para o mundo presente, que eles resistem por muito tempo aos movimentos da pura graça em seus corações, até que os ventos do Espírito expirem, e não mais reviva, de acordo com essa terrível ameaça: "o meu Espírito não mais lutará com o homem, pois ele é carnal.”, Gênesis 6.
3. Chego agora a perceber que Deus é abundante em perdão. Este Deus tem declarado em palavras tão plenas e expressivas, como pode satisfazer abundantemente os espíritos mais tenros e temerosos: "Buscai o SENHOR enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto. Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo, os seus pensamentos; converta-se ao SENHOR, que se compadecerá dele, e volte-se para o nosso Deus, porque é rico em perdoar. Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o SENHOR, porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos.” (Is 55.6-9).
O apóstolo diz: "Deus é rico em misericórdia”, Ef 2. Não é dito que ele é rico em substância, ainda que a terra seja do Senhor, e toda a sua plenitude. Ele é rico em suas próprias
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perfeições, e não em coisas externas. Não é dito, que é rico em poder, embora ele seja todo-poderoso, nem no juízo, mas na misericórdia; isso significa que de todas as perfeições divinas, nada brilha tão radiantemente quanto a sua misericórdia. Isso reflete um brilho em seus outros atributos. Sua bondade é a base da sua glória. Ele perdoou dez mil talentos ao servo que estava insolvente, e seu tesouro é interminável.
Vou considerar agora a extensão de sua misericórdia perdoadora, e a inteireza da mesma.
1. A sua extensão, no que diz respeito ao número e à qualidade dos pecados que são perdoados.
Primeiro, o número deles. Davi, depois de uma consideração atenta da pureza e da perfeição da lei de Deus, irrompe em uma grande ansiedade, "Quem pode entender os seus erros? Quem pode enumerar as muitas transgressões a esta regra estreita do nosso dever?" Em muitas coisas que tudo ofendem. Somos obrigados perpetuamente a obedecer e a glorificar a Deus, mas em cada ação, mesmo em nossos deveres religiosos, há muitos defeitos e impurezas que requerem o perdão. Quantos enxames de pensamentos fúteis e inúteis, de avarezas carnais; pensamentos orgulhosos, invejosos e vingativos e desejos alojados nos corações dos homens? Quantas palavras vãs fluem de seus
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lábios? Quantos milhares de ações pecaminosas continuam com eles? Quando a consciência esclarecida reflete seriamente sobre os nossos pecados de omissão e comissão, quão surpreendente é seu grande número? O que um amontoado montanhoso parece? Eles chegam tão baixo como o inferno, e sobem tão alto quanto o céu. Iria cansar a mão de um anjo anotar os perdões que Deus concede a um crente penitente.
Em segundo lugar, o perdão divino se estende para os pecados de todos os tipos e graus, habituais e reais. Embora nenhum pecado seja absolutamente pequeno, sendo cometido contra a majestade de Deus, no entanto, comparativamente, com relação à sua qualidade e às circunstâncias, há uma diferença evidente entre eles. Alguns são de uma tintura mais fraca, alguns são de um teor mais profundo; alguns ferem ligeiramente a consciência. Pecados de ignorância e fraqueza, pecados de paixões, pecados contra a luz, que nada mais são do que a natureza do pecado, pecados contra misericórdias, que na linguagem do apóstolo, são um "desprezo da bondade de Deus", pecados contra os votos solenes, pecados cometidos habitual e presunçosamente, como se Deus fosse ignorante ou indiferente e alheio, ou impotente para punir os infratores; esses carregam uma maior culpa, e expõem a uma punição mais
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terrível. Agora, um perdão gracioso é oferecido no evangelho a todos os pecadores, seja qual for a qualidade e as circunstâncias de seus pecados. A promessa é abrangente para todos os tipos de pecados, quão variados e poderosos possam ser, seja de quem for. Além disso, para nos encorajar a nos arrependermos e crermos, Deus promete perdão aos pecados das mais ferozes provocações. Judá tinha violado a aliança com Deus por suas idolatrias impuras, mas ele se oferece para recebê-los. "Tu te prostituíste com muitos amantes, mas ainda assim, torna para mim, diz o Senhor."
Recaídas em pecados rebeldes argumentam uma forte propensão para eles, e extremamente agravam a sua culpa, mas Deus promete perdão para eles: “Convertei-vos filhos rebeldes, eu curarei as vossas rebeliões." Há casos eminentes da misericórdia redentora de Deus gravados na Escritura. O apóstolo tendo enumerado muitos tipos de pecadores culpados de crimes enormes, idólatras, adúlteros, diz aos Coríntios, “e tais fostes alguns de vós, mas fostes lavados, mas fostes santificados, mas fostes justificados em o nome do Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito do nosso Deus." Há uma espécie de pecadores excluídos da promessa geral de misericórdia, aqueles que pecam contra o Espírito Santo. O motivo da exceção não é, que o Espírito Santo é superior em dignidade ao Pai e ao Filho, porque todos eles são coeternos e
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coiguais, mas em razão de suas operações, ou seja, a revelação da verdade e da graça de Deus no evangelho. Agora, a malícia obstinada e contradizente da verdade do evangelho brilhando nas mentes dos homens, e o desprezo perverso da graça do evangelho, é imperdoável para a infinita misericórdia. Aqueles que são culpados do pecado, têm se transformado na imagem do diabo, e a salvação não pode alcançá-los. Mas nenhum outro é excluído do arrependimento e do perdão.
2. Vejamos agora a extensão, a medida, a inteireza do perdão oferecido aos pecadores que revela a grande misericórdia de Deus.
1. O perdão é tão completo quanto livre, de acordo com a sua excelente bondade: a imputação da culpa cessa, e a obrigação de punição foi abolida. Nós temos evidências claras disso na Escritura. Deus assegura àqueles que se arrependem e se convertem, "ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve: ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a lã." O perdão é mais do que um adiamento ou suspensão do julgamento, é uma liberdade perfeita: um crente arrependido é tão livre da acusação da lei como um anjo inocente. "Não há condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus, que não andam segundo a carne, mas segundo o espírito." Rom 8. Nossa limpeza das
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impurezas do pecado é imperfeita, portanto, devemos estar sempre nos purificando, até que cheguemos à pureza absoluta, mas o nosso perdão é perfeito. É irrevogável, temos a certeza, que, tanto quanto o leste dista do oeste, Deus remove as nossas transgressões de nós. Tão logo esses pontos distantes possam ser unidos, assim a culpa pode ser fixada sobre aqueles a quem Deus perdoou. O profeta declara que "Deus vai subjugar nossas iniquidades, e lançá-las no fundo do mar, Sl 103, de onde eles nunca podem subir. Deus promete: “Eu perdoarei as suas iniquidades, e delas não mais me lembrarei." Miq 7. O perdão é completo e final. É a miséria dos ímpios "eles já estão condenados" Jer 31.34. Vivem por um indulto e suspensão de julgamento: é a segurança abençoada dos crentes, que eles "não cairão sob condenação. Há uma tal inconstância na natureza dos homens, que muitas vezes se arrependem e revogam os favores e privilégios que eles têm concedido, eles gostam hoje, e rejeitam amanhã as mesmas pessoas, mas o bendito Deus não está sujeito a alterações ou contingências. Seu amor, seu propósito, sua promessa ao seu povo, são inalteráveis.
2. A inteireza deste grande benefício é evidente em que Deus restaura o seu amor e favor para todos os que são perdoados. Príncipes, algumas vezes perdoam ofensores, mas nunca mais os recebem em seu favor. Absalão foi chamado do
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banimento, mas por dois anos não foi admitido para ver o rosto do rei. Mas Deus magnifica e manifesta o seu amor por aqueles a quem Ele perdoa. Ele não os distingue dos anjos que sempre lhe obedecem. Ele perdoa os nossos pecados inteiramente como se eles nunca tivessem sido cometidos, e se reconcilia conosco, como se ele nunca tivesse sido ofendido. Temos a descoberta mais clara disto na parábola do filho pródigo. Poderia ter sido esperado, que seu pai devesse tê-lo repreendido por seu obstinado abandono de sua casa, por ter desperdiçado sua parte na herança na perversidade e na luxúria, e que por um constrangimento amargo fosse obrigado a retornar; não, ele carinhosamente o abraça e cancela toda a dívida de seus crimes passados com um beijo mais carinhoso; e enquanto o pobre penitente presumia apenas que seria recebido como um servo, ele foi restaurado da maneira mais carinhosa à dignidade e à relação de um filho, a alegria universal foi difundida por toda a família pelo o seu retorno. Se o nosso Salvador não tivesse feito essa relação com todas as suas circunstâncias cativantes, os nossos corações estritamente impuros nunca presumiriam e nos prometeriam esse amor compassivo de Deus pelos pecadores arrependidos. Mas quem imita o filho pródigo em seu retorno, deverá enfrentar a realidade para superar a ilustração. Vou acrescentar alguns exemplos deste amor de Deus para
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aqueles que se arrependem. Maria Madalena havia sido culpada de pecados, mas nosso Salvador graciosamente recebeu as manifestações de sua dor e de amor, para o espanto de Simão: "Ela lavou os pés com as suas lágrimas e enxugou-os com os cabelos da sua cabeça, e os beijou", e ele, depois de sua ressurreição apareceu pela primeira vez a ela. Isto é recordado pelo evangelista, com uma infinita ênfase de seu amor, que "apareceu primeiramente a Maria Madalena, da qual tinha expulsado sete demônios." Pedro, em cuja negação de Cristo, havia uma mistura de infidelidade, ingratidão e impiedade, prometeu que iria morrer com ele ou para ele, e ainda que não sendo questionado com terror por um magistrado armado, nem surpreendido por um examinador sutil, mas sendo perguntado por uma empregada negou a Cristo, mas ele foi restaurado para a honra de seu ofício, e o carinho de seu mestre. É muito observável, que quando ele apareceu a Maria Madalena, ele lhe pediu que anunciasse a seus discípulos e a Pedro a sua ressurreição, ele particularmente menciona Pedro, para levantar o seu espírito abatido, com esta nova garantia do seu amor.
Este privilégio feliz pertence a todos os crentes arrependidos, porque quem Deus perdoa ele elege, e adota em sua família, e os torna herdeiros do céu. O primeiro feixe de misericórdia brilha no perdão de nossos
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pecados, o que é uma garantia infalível de nossa libertação do castigo do pecado no inferno, e da nossa obtenção das alegrias do céu. Nosso Salvador por seus sofrimentos meritórios e voluntários pagou nosso resgate da morte eterna, e comprou para nós o direito à vida eterna. "A quem Deus justifica, ele glorifica”. O efeito formal da justificação é a nossa restauração no favor perdido de Deus, e dessa fonte fluem todos benefícios abençoados. Deus declara a respeito de seu povo: "Eles serão para mim particular tesouro, naquele dia que prepararei, diz o SENHOR dos Exércitos; poupá-los-ei como um homem poupa a seu filho que o serve.”, Mal 3.17.
Tradução e adaptação feitas pelo Pr Silvio Dutra, de um texto de William Bates, em domínio público.
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Perdão Comprovado
Pode perdoar os piores pecados e os maiores pecadores, e dar a estes uma entrada garantida no Seu reino de glória eterna.
Provou isto em seu ministério terreno perdoando, e salvando o ladrão na cruz, a prostituta na casa do fariseu Simão, o endemoninhado gadareno, o astuto Zaqueu, o perseguidor Paulo, a mulher adúltera que os judeus queriam apedrejar, e nos faltaria espaço para enumerar todos os grandes pecadores que Jesus salvou perfeitamente e para sempre.
Não há portanto, motivo para duvidar da sua fidelidade, amor, poder e perdão.
Não há porque não confiar totalmente nEle e adorá-lo e consagrar toda a nossa vida para servi-lo com amor voluntário e fervoroso.
Deleitemo-nos no Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, e também na sua grande salvação, que nos livrou para todo o sempre da condenação eterna.
Entoemos louvores ao Seu grande Nome.
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Ampliação do Entendimento do Significado do Perdão
Nós temos para a nossa palavra perdão em português, pelo menos duas palavras no original grego do Novo Testamento para designar o ato de perdoar. São elas:
Charizomai – perdoar, conceder favor ou graça, livrar, apagar a dívida.
Aphiêmi – perdoar, remir, deixar ir, liberar o endividado, entre outros significados.
Esta distinção que temos no grego para um mesmo significado nos auxilia a ter uma melhor compreensão tanto do perdão divino em relação aos homens, e destes entre si. Vemos, portanto, que perdoar é muito mais do que simplesmente esquecer ofensas sofridas, significado este a propósito, que não é encontrado nas palavras originais.
Estamos destacando a seguir algumas ocorrências destas duas palavras em textos que extraímos do Novo Testamento.
Uma reflexão destas passagens bíblicas há de surtir um bom efeito em nossas mentes e corações sobre algo muito importante que nunca devemos esquecer e sempre praticar.
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1 - Charizomai – perdoar, conceder favor ou graça, livrar, apagar a dívida.
Lucas 7.2 E, não tendo eles com que pagar, perdoou-lhes (Charizomai) a ambos. Dize, pois, qual deles o amará mais?
Lucas 7.43 E Simão, respondendo, disse: Tenho para mim que é aquele a quem mais perdoou (Charizomai). E ele lhe disse: Julgaste bem.
2 Coríntios 2.7 De maneira que pelo contrário deveis antes perdoar-lhe (Charizomai) e consolá-lo, para que o tal não seja de modo algum devorado de demasiada tristeza.
2 Coríntios 2.10 E a quem perdoardes (Charizomai) alguma coisa, também eu; porque, o que eu também perdoei (Charizomai), se é que tenho perdoado (Charizomai), por amor de vós o fiz na presença de Cristo; para que não sejamos vencidos por Satanás;
2 Coríntios 12.13 Pois, em que tendes vós sido inferiores às outras igrejas, a não ser que eu mesmo vos não fui pesado? Perdoai-me (Charizomai) este agravo.
Efésios 4.32 Antes sede uns para com os outros benignos, misericordiosos, perdoando-vos (Charizomai) uns aos outros, como também Deus vos perdoou (Charizomai) em Cristo.
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Colossenses 2.13 E, quando vós estáveis mortos nos pecados, e na incircuncisão da vossa carne, vos vivificou juntamente com ele, perdoando-vos (Charizomai) todas as ofensas,
Colossenses 3.13 Suportando-vos uns aos outros, e perdoando-vos (Charizomai) uns aos outros, se alguém tiver queixa contra outro; assim como Cristo vos perdoou (Charizomai), assim fazei vós também.
2 – Aphiêmi – perdoar, remir, deixar ir, liberar o endividado, entre outros significados.
Mateus 6.12 E perdoa-nos (Aphiêmi) as nossas dívidas, assim como nós perdoamos (Aphiêmi) aos nossos devedores;
Mateus 6.14 Porque, se perdoardes (Aphiêmi) aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará (Aphiêmi) a vós;
Msateus 6.15 Se, porém, não perdoardes (Aphiêmi) aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará (Aphiêmi) as vossas ofensas.
Mateus 9.2 E Jesus, vendo a fé deles, disse ao paralítico: Filho, tem bom ânimo, perdoados (Aphiêmi) te são os teus pecados.
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Mateus 9.5 Pois, qual é mais fácil? dizer: Perdoados (Aphiêmi) te são os teus pecados; ou dizer: Levanta-te e anda?
Mateus 9.6 Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra autoridade para perdoar (Aphiêmi) pecados (disse então ao paralítico): Levanta-te, toma a tua cama, e vai para tua casa.
Mateus 12.31 Portanto, eu vos digo: Todo o pecado e blasfêmia se perdoará (Aphiêmi) aos homens; mas a blasfêmia contra o Espírito não será perdoada (Aphiêmi) aos homens.
Mateus 12.32 E, se qualquer disser alguma palavra contra o Filho do homem, ser-lhe-á perdoado (Aphiêmi); mas, se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado (Aphiêmi), nem neste século nem no futuro.
Mateus 18.21 Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei (Aphiêmi)? Até sete?
Mateus 18.27 Então o Senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe (Aphiêmi) a dívida.
Mateus 18.32 Então o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te (Aphiêmi) toda aquela dívida, porque me suplicaste.
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Mateus 18.35 Assim vos fará, também, meu Pai celestial, se do coração não perdoardes (Aphiêmi), cada um a seu irmão, as suas ofensas.
Marcos 2.5 E Jesus, vendo a fé deles, disse ao paralítico: Filho, perdoados (Aphiêmi) estão os teus pecados.
Marcos 2.7 Por que diz este assim blasfêmias? Quem pode perdoar (Aphiêmi) pecados, senão Deus?
Marcos 2.9 Qual é mais fácil? dizer ao paralítico: Estão perdoados (Aphiêmi) os teus pecados; ou dizer-lhe: Levanta-te, e toma o teu leito, e anda?
Marcos 2.10 Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar (Aphiêmi) pecados (disse ao paralítico),
Marcos 3.28 Na verdade vos digo que todos os pecados serão perdoados (Aphiêmi) aos filhos dos homens, e toda a sorte de blasfêmias, com que blasfemarem;
Marcos 4.12 Para que, vendo, vejam, e não percebam; e, ouvindo, ouçam, e não entendam; para que não se convertam, e lhes sejam perdoados (Aphiêmi) os pecados.
Marcos 11.25 E, quando estiverdes orando, perdoai, se tendes alguma coisa contra alguém,
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para que vosso Pai, que está nos céus, vos perdoe (Aphiêmi) as vossas ofensas.
Marcos 11.26 Mas, se vós não perdoardes (Aphiêmi), também vosso Pai, que está nos céus, vos não perdoará (Aphiêmi) as vossas ofensas.
Lucas 5.20 E, vendo ele a fé deles, disse-lhe: Homem, os teus pecados te são perdoados (Aphiêmi).
Lucas 5.21 E os escribas e os fariseus começaram a arrazoar, dizendo: Quem é este que diz blasfêmias? Quem pode perdoar pecados (Aphiêmi), senão só Deus?
Lucas 5.23 Qual é mais fácil? dizer: Os teus pecados te são perdoados (Aphiêmi); ou dizer: Levanta-te, e anda?
Lucas 5.24 Ora, para que saibais que o Filho do homem tem sobre a terra poder de perdoar (Aphiêmi) pecados (disse ao paralítico), a ti te digo: Levanta-te, toma a tua cama, e vai para tua casa.
Lucas 7.47 Por isso te digo que os seus muitos pecados lhe são perdoados (Aphiêmi), porque muito amou; mas aquele a quem pouco é perdoado (Aphiêmi) pouco ama.
Lucas 7.48 E disse-lhe a ela: Os teus pecados te são perdoados (Aphiêmi).
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Lucas 7.49 E os que estavam à mesa começaram a dizer entre si: Quem é este, que até perdoa (Aphiêmi) pecados?
Lucas 11.4 E perdoa-nos (Aphiêmi) os nossos pecados, pois também nós perdoamos (Aphiêmi) a qualquer que nos deve, e não nos conduzas à tentação, mas livra-nos do mal.
Lucas 12.10 E a todo aquele que disser uma palavra contra o Filho do homem ser-lhe-á perdoada (Aphiêmi), mas ao que blasfemar contra o Espírito Santo não lhe será perdoado (Aphiêmi).
Lucas 17.3 Olhai por vós mesmos. E, se teu irmão pecar contra ti, repreende-o e, se ele se arrepender, perdoa-lhe (Aphiêmi).
Lucas 17.4 E, se pecar contra ti sete vezes no dia, e sete vezes no dia vier ter contigo, dizendo: Arrependo-me; perdoa-lhe (Aphiêmi).
Lucas 23.34 E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes (Aphiêmi), porque não sabem o que fazem. E, repartindo as suas vestes, lançaram sortes.
Atos 8.22 Arrepende-te, pois, dessa tua iniquidade, e ora a Deus, para que porventura te seja perdoado (Aphiêmi) o pensamento do teu coração;
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Romanos 4.7 Bem-aventurados aqueles cujas maldades são perdoadas (Aphiêmi), e cujos pecados são cobertos.
Tiago 5.15 E a oração da fé salvará o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados (Aphiêmi).
I João 1.9 Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar (Aphiêmi) os pecados, e nos purificar de toda a injustiça.
I João 2.12 Filhinhos, escrevo-vos, porque pelo seu nome vos são perdoados (Aphiêmi) os pecados.
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A Quem Devemos Perdoar?
O exercício do perdão conforme ensinado e demandado por nosso Senhor Jesus Cristo pode parecer, por uma interpretação precipitada, algo que ultrapasse o racional e aceitável, especialmente por ter dito que devemos perdoar não sete vezes, mas setenta vezes sete.
Evidentemente, tal princípio não foi estabelecido por Ele para o caso de transgressores contumazes e que se deleitam na prática do mal. Até mesmo porque não haveria qualquer sentido lógico em se perdoar quem pouco ou nada está interessado em ser perdoado – e que, ao contrário... sua meta é ofender, destruir, inquietar, matar, e achar nisto tudo um bom motivo de prazer sem que nada lhe incomode a consciência má e cauterizada.
Por isso, nosso Senhor interpôs a necessidade de arrependimento sincero para a concessão do perdão.
Ele disse:
“Acautelai-vos. Se teu irmão pecar contra ti, repreende-o; se ele se arrepender, perdoa-lhe.
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Se, por sete vezes no dia, pecar contra ti e, sete vezes, vier ter contigo, dizendo: Estou arrependido, perdoa-lhe.” (Lucas 17.3,4)
Porque o “acautelai-vos”? Justamente para não sermos achados em falta diante de Deus por não perdoarmos quem deveria ser perdoado.
Veja que, segundo o ensino de nosso Senhor, o faltoso deve ser repreendido. Ele deve sr conscientizado do mal que praticou – se a nós ou a outros.
Caso manifeste sincero arrependimento, ou seja, se mudou o seu comportamento, confessando-se arrependido, então temos o dever de perdoá-lo, uma vez que nós mesmos necessitamos ser perdoados por outros e por Deus, não poucas vezes, pelos erros que cometemos.
Num mundo de pecadores, o perdão sincero e de coração é necessário, especialmente para uma boa continuidade do relacionamento em amor entre aqueles que amam a justiça e não a impiedade.
Portanto, perdoe seu irmão, seu filho, seu cônjuge, seu amigo, seu próximo, por algum mal que tenha praticado, quando se encontrava sob circunstâncias de pressões internas (sistema nervoso abalado etc) ou externas
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(ataque de demônios, provocações ímpias e desagradáveis etc).
O caráter de uma pessoa não deve ser medido por estes atos falhos que nos acompanham - e em uns mais do que em outros, variando na escala dos setenta vezes sete. Não importa o nível da frequência. O que importa é a real estrutura do caráter e o desejo de buscar a paz que é filha da verdade e da justiça, e que tem em vista o amor não fingido.
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A Necessidade Crucial do Perdão
O exercício diário do perdão é o meio de estarmos em paz em nossas consciências e corações, pela graça que recebemos de Deus, porque quando perdoamos os nossos ofensores somos também perdoados por Ele, de modo que não somos sujeitados aos Seus juízos decorrentes da nossa falta de perdão.
Muito destes juízos consiste em ficarmos à mercê dos poderes espirituais opressores que operam de modo opressivo, porque o coração que não perdoa se fecha e não pode ser invadido pela graça de Deus, e fica portanto à mercê da ação dos demônios que andam ao nosso derredor procurando oportunidade para nos afligir.
Deus nos tem perdoado em Cristo uma multidão de pecados pelos quais jamais poderíamos pagar para satisfazer à justiça da santidade divina, e assim como Ele nos perdoou em Cristo, também devemos perdoar.
Então, somos disciplinados pelo Senhor com os Seus juízos corretivos quando nos deixamos vencer por mágoas, ressentimentos e amarguras contra o nosso próximo, seja por qual motivo for, e Jesus deixou isto bastante claro para nós em Seu ensino constante dos evangelhos.
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Ao ouvir o ensino de nosso Senhor relativo ao exercício da disciplina na Igreja, Pedro se antecipou aos demais discípulos e Lhe perguntou Jesus quantas vezes estaria obrigado a perdoar um irmão faltoso.
Ele se valeu da tradição dos escribas e fariseus quando perguntou se até sete vezes, porque eles ensinavam que este era o número máximo que uma pessoa poderia ser perdoada por alguém.
Nós temos no texto de Mateus 18.21-35 a explicação do espírito com o qual a disciplina deve ser aplicada na Igreja, a saber, com “toda a longanimidade e doutrina”, ou seja com paciência para com as faltas de outros, e seguindo o reto ensino de nosso Senhor relativo ao assunto.
Se nós formos perder a nossa tranquilidade de mente por causa do pecado de outros, nós nunca poderemos ter paz com Deus, porque o diabo sempre usará isto contra nós. É preciso pois ser sempre longânimos.
É preciso pois aprender do mesmo exemplo de longanimidade de Cristo e dos apóstolos, especialmente os líderes do povo de Deus, para que não venhamos a destruir a obra que Ele nos tem designado para dirigir, por causa de um destempero que não nos permita sermos longânimos para com todos, conforme é
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necessário, para que em meio a todas as dificuldades que venhamos a encontrar no caminho no nosso relacionamento com as pessoas, especialmente nas dificuldades criadas por Satanás.
A longanimidade é uma atitude pessoal de não se irar com facilidade e rapidamente em relação aos outros.
Portanto, ao tratarmos de assuntos como a ira de Deus, que é um dos Seus atributos, sobre assuntos relativos ao Seu juízo, e ao inferno, não devemos esquecer que Deus é longânimo, e que por isso, muitas vezes retarda o Seu juízo, dá oportunidades imensas aos Seus inimigos para se arrependerem, suporta com muita longanimidade as iniquidades dos vasos de ira, e não se permite ter qualquer perturbação de mente por causa das transgressões deles.
É particularmente neste aspecto que Jesus nos chama a imitar o Seu próprio exemplo de mansidão e humildade, que são a base da sua completa longanimidade.
Longanimidade é a capacidade de suportar ofensas e danos sem precipitar-se numa ira condenatória sobre quem nos ofendeu ou prejudicou.
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É pois muito mais do que a capacidade de ser paciente em circunstâncias gerais adversas, pois está implícito o retardamento da ira e do juízo com vistas a não se ressentir contra as faltas sofridas da parte de outros, e da não aplicação de um castigo imediato sobre eles, se isto se encontra na esfera do nosso poder e autoridade.
Não há um limite para este espírito de longanimidade, revelando-se no poder prático de se perdoar ofensas de coração, assim como Jesus ensinou aos seus discípulos, quando à vista destes ensinos Pedro lhe perguntou se deveria perdoar o irmão que pecasse contra ele apenas até sete vezes, e o Senhor lhe afirmou e ensinou com uma metáfora e uma parábola, que a longanimidade em suportar ofensas e a atitude e o ato de perdoá-las deve seguir o padrão do próprio Deus, que é completamente longânimo e perdoador, não tendo fixado em seu caráter qualquer limite para ser longânimo e perdoador em relação àqueles que verdadeiramente se arrependem, pois será longânimo para com eles e os perdoará toda vez que se arrependerem de seus pecados e ofensas.
Com a metáfora Jesus disse que Deus não perdoa até sete vezes, mas até setenta vezes sete, e devemos ser imitadores de Deus especialmente em relação a isto (Mt 18.21,22).
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Com a chamada parábola do credor incompassivo Jesus ensinou que Ele perdoa dívidas, ainda que sejam de dez mil talentos, e que não seremos abençoados por Deus, e na verdade seremos sujeitados ao juízo de sermos corrigidos e disciplinados até que nos disponhamos a ser longânimos e perdoadores, ainda que a dívida que tenhamos que perdoar de alguém seja pequena como a do homem da parábola, que mandou prender quem lhe devia apenas cem denários (Mt 18.23-35).
Veja que não se fala de perdão barato na Bíblia, apesar de ser sempre pela graça, porque sempre está implícita a necessidade de arrependimento do ofensor. Na falta deste arrependimento não há qualquer sentido no perdão.
Pode parecer um paradoxo, mas o nome de Deus é glorificado, exaltado e honrado pela exibição da Sua completa longanimidade e misericórdia a pobres pecadores, num mundo sujeito ao pecado. Lembremos que a dívida que o homem da parábola se recusou a perdoar era de apenas cem denários, quando ele próprio teve uma dívida de sessenta milhões de denários perdoada por Deus. E este homem que foi perdoado de tal maneira representa todos aqueles que foram salvos pelo perdão de Jesus.
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A maior glória do Senhor está exatamente no fato de perdoar pecados e ser longânimo para com os pecadores, porque isto Lhe traz muita gratidão, louvor, adoração e amor.
Daí ter dito a Moisés o seguinte quando este lhe pediu que lhe mostrasse a Sua glória:
"Tendo o Senhor passado perante Moisés, proclamou: Jeová, Jeová, Deus misericordioso e compassivo, tardio em irar-se (longânimo em outras versões) e grande em beneficência e verdade;" (Êx 34.6).
Cremos que do fruto do Espírito que mais necessitaremos nestes últimos dias é exatamente a longanimidade, porque sem isto não será possível prosseguir adiante porque o Inimigo nos deterá instilando mágoa, ira e toda sorte de sentimentos rancorosos em face do pecado, que se multiplicará cada vez mais ao nosso redor, porque Jesus afirmou que neste tempo a iniquidade se multiplicaria esfriando o amor de muitos.
Finalmente, lembramos que nem mesmo o nosso zelo pela obra do Senhor pode justificar a falta de longanimidade.
É especialmente aqui que ela deve ser manifestada porque senão o nosso zelo será a
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causa mesma da destruição da obra que Deus determinou fazer por nosso intermédio.
Toda pregação deve ser densa e nunca fazer concessões em favor do pecado e contra a verdade. Mas não podemos esquecer que a longanimidade faz parte da verdade que estamos incumbidos de pregar e viver.
Ser longânimo não significa portanto, ser tolerante com os pecados de nossa congregação. Em se fazer vista grossa para o pecado, nem muito menos de justificar o pecador, mas lembrar que não nos é dado fechar a porta da oportunidade para o arrependimento, seja pelo tempo que for necessário, e seja para quem for, enquanto não tivermos recebido da parte do Senhor nenhuma determinação para fechá-la.
Quando Paulo entregou o jovem incestuoso de Corinto nas mãos de Satanás para a destruição da carne, ele tomou tal deliberação congregado em espírito com a Igreja de Corinto e no poder de Jesus Cristo (I Cor 5.3,4) e não simplesmente porque ele havia ficado escandalizado ou então por ter perdido a paciência.
Lembremos que, especialmente muitos jovens na Igreja, levarão muito tempo até que tenham uma experiência real de conversão ao Senhor.
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Se não formos longânimos com eles, nós os privaremos e a nós mesmos de vermos Cristo sendo formado neles.
Pela Sua longanimidade o Senhor tem dado tempo a eles para que se convertam e a nós cabe seguir o mesmo exemplo de longanimidade do Senhor deles e nosso, de forma a cooperarmos com o Seu trabalho.
Perdoemos e seremos perdoados.
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Como Nós Perdoamos Nossos Devedores
Pessoas irreconciliáveis com outros pela falta de perdão estão em grande perigo porque podem não ser salvas por Deus porque Ele não perdoará aqueles que não se dispõem a perdoar outros.
Entretanto, não é pelo mérito de perdoar outros que nós ganhamos o céu, mas isto é uma evidência que fomos de fato perdoados por Deus.
Um ministro do evangelho deve então ser um exemplo de perdão aos seus ofensores, e estimular os membros de sua congregação a seguir o seu exemplo, de maneira que ninguém venha a ser um empecilho para que outros não venham a perder o céu pela falta de perdão que vê na própria Igreja e não se sinta incentivado a perdoar seus ofensores.
Thomas Watson nos deu algumas pistas para entender melhor o que é o perdão.
Ele pergunta: Quando nós perdoamos outros?
E responde: Quando nós nos esforçamos contra todos os pensamentos de vingança; quando nós não prejudicamos nossos inimigos, mas desejamos o bem para eles, e nos afligimos com as suas calamidades, quando oramos por eles,
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quando buscamos reconciliação com eles, e nos mostramos prontos em todas as ocasiões para aliviá-los.
Cada uma das partes dessa definição de Watson vem das seguintes passagens bíblicas: Rom 12:,18,19, I Tes 5:15; Lc 6:28; Pv 24:17; Mt 5:44; Êx 23:4.
Agora, nesta definição de Watson não entra a ira contra o pecado. Não significa que devemos pensar bem do mal que nos fizeram, mas não significa também que devemos desejar o mal a quem nos prejudicou. Nós devemos entregar o caso a Deus que julga retamente (I Pe 2.23).
O perdão não significa também eximir os outros das consequências sérias do pecado. Um pastor pode denunciar uma pessoa por um crime que culmine com a sua prisão, e no entanto não abrigar sentimentos de vingança contra tal pessoa.
Deus pode perdoar seus filhos, pelas faltas deles, mas pode corrigi-los por suas faltas, tal como exemplifica o que sucedeu a Davi no pecado com Bate Seba.
De igual modo nós podemos corrigir nossos filhos, ou membros na Igreja, e no entanto não abrigarmos um espírito irreconciliável
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Nós temos o dever de perdoar a todo irmão que nos tenha ofendido e que demonstre um verdadeiro arrependimento quanto ao mal que nos fez.
Mas até mesmo quando uma pessoa não se arrepende nos é ordenado que a amemos e que oremos pelo seu bem (Lc 6.27).
A diferença está no fato de que quando a pessoa que nos prejudicou não se arrepende, apesar de desejarmos o bem dela, nós não podemos levar a cabo a reconciliação ou o retorno à comunhão.
Thomas Watson disse apropriadamente que: "Nós não somos chamados a confiar num inimigo; mas nós somos chamados a perdoá-lo.”.
Assim, você pode olhar alguém na face e dizer: eu o perdoo, mas eu não confio em você.
Mas, em dizer isto e afirmar que nunca mais aceitará qualquer esforço daquela pessoa em restaurar a confiança perdida e que não nos preocupamos que venha a ser arruinada, com isto demonstramos um espírito não perdoador, e ficamos nós mesmos sujeitos às correções do Senhor.
“10 Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus.
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11 Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguiram e, mentindo, disserem todo mal contra vós por minha causa.
12 Alegrai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram aos profetas que foram antes de vós.” - Mt 5.10-12)
O texto não diz que são bem-aventurados os que sofrem por causa de fanatismo, ou por causa de excesso de zelo religioso, ou por razões político religiosas, ou por causas beneficentes, nem ainda por motivo de bondade pessoal, mas por causa da justiça.
Praticar a justiça neste texto de Mateus 5.10-12 corresponde a ser como é o Senhor Jesus. Os bem-aventurados são então aqueles que são como Ele.
Estes que são semelhantes a Cristo sempre sofrem perseguição.
Jesus disse que assim como Ele foi perseguido, aqueles que fossem efetivamente seus discípulos, imitando-o como seu Mestre, seriam também perseguidos (João 5.18-20).
Paulo confirmou esta verdade proferida por Jesus em II Tim 3.12, dizendo que todo aquele que vivesse piedosamente em Cristo padeceria perseguição.
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Estes que são perseguidos por causa da justiça, não o são por serem pessoas boas, mas por serem muito diferentes dos seus perseguidores.
É a santidade de Cristo refletida na vida dos seus discípulos que gera esta perseguição, não somente pelo mundo, mas também pelos que são da Igreja e cujas vidas não estão santificadas.
A oposição da carne ao Espírito se verá em todos os escalões e aspectos. A antiga oposição das trevas contra a luz há de persistir até a consumação dos séculos, porque a luz reprova as trevas, e os que andam nas trevas não suportam ter suas vidas reprovadas pelas vidas dos que têm andado na luz.
Não foi o que se deu com Caim em relação a Abel? Com Saul em relação a Davi? Não foi este o motivo da perseguição de Daniel, de Elias, Jeremias, Paulo e todos os demais apóstolos?
Muitas das perseguições destes que amam e praticam a justiça, por serem semelhantes a Cristo partem em sua maior parte da própria Igreja.
Vem especialmente da parte de cristãos nominais que não conhecem efetivamente a Cristo.
O testemunho de vida que vêm naqueles que andam no Espírito é um atestado de condenação
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deles e por isso sentem-se compelidos a perseguir aqueles nos quais tentarão encontrar erros que justifique as suas vidas condenadas.
Tentarão por todos os meios encontrar oportunidades para tentar os justos, de maneira que possam achar neles alguma falta.
Não foi exatamente isto que os fariseus e os escribas fizeram com Jesus?
Não foram justamente os judeus que mais perseguiram o primeiros cristãos?
E as perseguições da Igreja Romana aos reformadores e aos que os antecederam brilhando como luz nas trevas?
Mas não há maiores perseguições do que as que os cristãos sofrem em suas próprias Igrejas da parte daqueles que vivem um cristianismo formal, que é sempre o maior inimigo de uma fé genuína.
Maiores são estas perseguições do que as que sofrem da parte das próprias pessoas do mundo.
Deste ensino de Jesus sobre a perseguição nós aprendemos que o cristão que está sustentando um testemunho verdadeiro não agrada a todos, muito ao contrário, há de desagradar àqueles que odiarem a luz, e eles manifestarão em
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algum grau, este ódio, traduzindo-o em perseguições.
Por isso Jesus disse que não era um bom sinal sermos louvados continuamente pelos homens, porque não é isto o que sucede a um verdadeiro profeta de Deus.
Se temos proferido verdadeiramente a Sua Palavra ao mundo de trevas isto produzirá muita perseguição tanto de fora, quando de dentro da própria Igreja.
Mas é exatamente quando isto sucede, que podemos estar tranquilos quanto ao fato de pertencermos ao Senhor, de sabermos que temos nisto não um motivo para tristeza, mas para uma verdadeira alegria, conforme dizer dos apóstolos Pedro e Tiago.
Assim como perseguiram ao nosso Senhor, também perseguirão a nós se estivermos vivendo tal como Ele.
Que nenhum cristão seja perseguido por motivo de ser agressivo, néscio, ou por praticar qualquer tipo de mal. Mas se é perseguido e
sofre por causa da sua semelhança com Cristo deve se alegrar nisto porque esta perseguição será sempre inevitável, e será uma mera consequência do cumprimento de uma verdade da qual fomos alertados pelo Senhor.
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Como Perdoar 70 x 7?
Ao ouvir o ensino de nosso Senhor relativo ao exercício da disciplina na Igreja, constante do 18º capítulo do evangelho de Mateus, Pedro se antecipou aos demais discípulos e perguntou a Jesus quantas vezes estaria obrigado a perdoar um irmão faltoso, até chegar à conclusão de que deveria considerá-lo um gentio e publicano.
Ele se valeu da tradição dos escribas e fariseus quando perguntou se até sete vezes, porque eles ensinavam que este era o número máximo que uma pessoa poderia ser perdoada por alguém.
Nós podemos perceber que há um encadeamento nestes ensinos, e que uma regra conduz a outra regra, não de modo legalista, mas nos diversos aspectos que estão relacionados neste grande assunto que podemos chamar de vida cristã.
Aqui temos então, a explicação do espírito com o qual a disciplina deve ser aplicada na Igreja, a saber, com “toda a longanimidade e doutrina”, ou seja com paciência para com as faltas de outros, e seguindo o reto ensino de nosso Senhor relativo ao assunto.
Longanimidade é fruto do Espírito Santo e não obra da lei.
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"19 Sabei isto, meus amados irmãos: Todo homem seja pronto para ouvir, tardio para falar e tardio para se irar.
20 Porque a ira do homem não opera a justiça de Deus.
21 Pelo que, despojando-vos de toda sorte de imundícia e de todo vestígio do mal, recebei com mansidão a palavra em vós implantada, a qual é poderosa para salvar as vossas almas." (Tiago 1.19-21)
O Tiago, autor da epístola que leva o seu nome, era também filho de Maria, e irmão de Jesus, e certamente ele viu desde há muito o exemplo de mansidão e de longanimidade que se encontravam em Jesus, apesar de ter sido dado a Ele pelo Pai, toda autoridade no céu e na terra para julgar.
Ele é o Senhor da ira contra o pecado, o Cordeiro que manifestará a Sua ira no tempo do fim, conforme vemos em Apocalipse, mas que ao mesmo tempo é manso e humilde de coração; e totalmente longânimo (tardio em se irar).
Não podemos medir a nossa ira pela ira de Deus, porque a ira do Senhor é perfeitamente justa e santa, e é Ele que tem o poder de julgar as consciências humanas e executar uma
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sentença de condenação sobre elas. A nós, não foi dada tal autoridade, ao contrário, somos ordenados a não passar este tipo de juízo condenatório definitivo nos outros, para que não sejamos julgados com a mesma medida que julgamos. E quão difícil e delicado é viver isto.
Por isso devemos examinar este assunto nas Escrituras, para podermos aplicar em nossas vidas a vontade de Deus quanto à diferença que há entre uma ira justificada e santa, e uma ira não justificada e não santa.
Lembremos que Moisés não estava em rebelião contra Deus, mas o povo de Israel sim, e murmuraram contra Ele. Mas quando Moisés descarregou a sua ira contra eles em Refidim, quem foi julgado por Deus naquela ocasião foi o próprio Moisés, e não eles. A Moisés, o ter se irado contra eles e batido na rocha, custou ser proibido de entrar em Canaã, ainda que tivesse insistido com o Senhor para entrar na terra prometida.
Moisés não foi julgado pelo Senhor porque se irou contra o pecado dos israelitas, porque a sua ira era justificada e santa, mas porque não conteve a sua ira, quando Deus não estava exercendo nenhum juízo sobre eles, e portanto cabia-lhe seguir o exemplo do Senhor naquela situação.
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Se tivesse de passar algum juízo, ele deveria passar o juízo determinado por Deus, e não agir pela própria conta.
Há um grande ensino para nós naquele incidente. O que faltou a Moisés foi longanimidade. Veja que problema é isto quando ela falta aos líderes da Igreja de Cristo.
Se nós formos perder a nossa tranquilidade de mente por causa do pecado de alguns cristãos da nossa igreja ou de outras, nós nunca poderemos ter paz com Deus, porque o diabo sempre usará isto contra nós. É preciso pois ser sempre longânimos, porque sempre haverá o joio entre nós.
É preciso pois aprender do mesmo exemplo de longanimidade de Cristo e dos apóstolos, especialmente os líderes do povo de Deus, para que não venhamos a destruir a obra que Ele nos tem designado para dirigir, por causa de um destempero que não nos permita sermos longânimos para com todos, conforme é necessário, para que em meio a todas as dificuldades que venhamos a encontrar no caminho no nosso relacionamento com as pessoas que Deus tem colocado debaixo do nosso cuidado, especialmente para que aquelas dificuldades criadas por Satanás, não venham a pôr a obra do Senhor a perder, por falta da nossa longanimidade.
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Por isso se ordena que a exortação pastoral seja feita segundo a doutrina, mas também com longanimidade: "prega a palavra, insta a tempo e fora de tempo, admoesta, repreende, exorta, com toda longanimidade e doutrina." (II Tim 4.2).
Para tanto o apóstolo Paulo destaca o seu próprio exemplo de longanimidade para ser seguido pelos líderes:
"Tu, porém, tens observado a minha doutrina, procedimento, intenção, fé, longanimidade, amor, perseverança," (II Tim 3.10).
E não somente aos líderes, como também a todos os cristãos, ele afirma a necessidade de serem longânimos para com todos:
"com toda a humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros em amor," (Ef 4.2).
"corroborados com toda a fortaleza, segundo o poder da sua glória, para toda a perseverança e longanimidade com gozo;" (Col 1.11).
A longanimidade é portanto uma atitude pessoal de não se irar com facilidade e rapidamente em relação aos outros.
Portanto, ao tratarmos de assuntos como a ira de Deus, que é um dos Seus atributos, sobre
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assuntos relativos ao Seu juízo, e ao inferno, não devemos esquecer que Deus é longânimo, e que por isso, muitas vezes retarda o Seu juízo, dá oportunidades imensas aos Seus inimigos para se arrependerem, suporta com muita longanimidade as iniquidades dos vasos de ira, e não se permite ter qualquer perturbação de mente por causa das transgressões deles.
E é particularmente neste aspecto que Jesus nos chama a imitar o Seu próprio exemplo de mansidão e humildade, que são a base da sua completa longanimidade.
De outra forma, por exemplo, como o próprio apóstolo Paulo poderia ter sido salvo, a não ser pela completa longanimidade de Jesus, da qual ele dá testemunho em I Tim 1.16, porque afinal foi perseguidor da Igreja antes da sua conversão?
Ele afirma ser o principal dos pecadores por causa desta perseguição da Igreja, ao qual Jesus demonstrou que é de fato totalmente longânimo, porque de outra forma não lhe teria perdoado e teria executado o Seu juízo sobre ele desde há muito.
Mas como é paciente na expectativa de que o pecador se arrependa e se converta, ele pôde ser salvo, assim como todos aqueles que têm sido alvo da longanimidade de Deus, porque não foi
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longânimo somente para com ele, Paulo, mas é para com todos os pecadores.
Longanimidade é a capacidade de suportar ofensas e danos sem precipitar-se numa ira condenatória sobre quem nos ofendeu ou prejudicou.
É pois muito mais do que a capacidade de ser paciente em circunstâncias gerais adversas, pois está implícito o retardamento da ira e do juízo com vistas a não se ressentir contra as faltas sofridas da parte de outros, e da não aplicação de um castigo imediato sobre eles, se isto se encontra na esfera do nosso poder e autoridade.
E não há um limite para este espírito de longanimidade, revelando-se no poder prático de se perdoar ofensas de coração, assim como Jesus ensinou aos seus discípulos, quando à vista destes ensinos Pedro lhe perguntou se deveria perdoar o irmão que pecasse contra ele apenas até sete vezes, e o Senhor lhe afirmou e ensinou com uma metáfora e uma parábola, que a longanimidade em suportar ofensas e a atitude e o ato de perdoá-las deve seguir o padrão do próprio Deus, que é completamente longânimo e perdoador, não tendo fixado em seu caráter qualquer limite para ser longânimo e perdoador em relação àqueles que verdadeiramente se arrependem, pois será
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longânimo para com eles e os perdoará toda vez que se arrependerem de seus pecados e ofensas.
Com a metáfora Jesus disse que Deus não perdoa até sete vezes, mas até setenta vezes sete, e devemos ser imitadores de Deus especialmente em relação a isto (18.21,22).
E com a chamada parábola do credor incompassivo Jesus ensinou que Ele perdoa dívidas, ainda que sejam de dez mil talentos, e que não seremos abençoados por Deus, e na verdade seremos sujeitados ao juízo de sermos corrigidos e disciplinados até que nos disponhamos a ser longânimos e perdoadores, ainda que a dívida que tenhamos que perdoar de alguém seja pequena como a do homem da parábola, que mandou prender quem lhe devia apenas cem denários (18.23-35). Veja que não se fala de perdão barato na Bíblia, apesar de ser sempre pela graça, porque sempre está implícita a necessidade de arrependimento do ofensor. Na falta deste arrependimento não há qualquer sentido no perdão.
Pode parecer um paradoxo, mas o nome de Deus é glorificado, exaltado e honrado pela exibição da Sua completa longanimidade e misericórdia a pobres pecadores, num mundo sujeito ao pecado. Lembremos que a dívida que o homem da parábola se recusou a perdoar era de apenas cem denários, quando ele próprio teve uma
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dívida de sessenta milhões de denários perdoada por Deus. E este homem que foi perdoado de tal maneira representa todos aqueles que foram salvos pelo perdão de Jesus, isto é, todos os cristãos verdadeiros.
A maior glória do Senhor está exatamente no fato de perdoar pecados e ser longânimo para com os pecadores, porque isto Lhe traz muita gratidão, louvor, adoração e amor.
Daí ter dito a Moisés o seguinte quando este lhe pediu que lhe mostrasse a Sua glória:
"Tendo o Senhor passado perante Moisés, proclamou: Jeová, Jeová, Deus misericordioso e compassivo, tardio em irar-se (longânimo em outras versões) e grande em beneficência e verdade;" (Êx 34.6).
Cremos que do fruto do Espírito que mais necessitaremos nestes últimos dias é exatamente a longanimidade, porque sem isto não será possível prosseguir adiante porque o Inimigo nos deterá instilando mágoa, ira e toda sorte de sentimentos rancorosos em face do pecado, que se multiplicará cada vez mais ao nosso redor, porque Jesus afirmou que neste tempo a iniquidade se multiplicaria esfriando o amor de muitos.
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Finalmente, lembramos que nem mesmo o nosso zelo pela obra do Senhor pode justificar a falta de longanimidade.
É especialmente aqui que ela deve ser manifestada porque senão o nosso zelo será a causa mesma da destruição da obra que Deus determinou fazer por nosso intermédio.
Toda pregação deve ser densa e nunca fazer concessões em favor do pecado e contra a verdade. Mas não podemos esquecer que a longanimidade faz parte da verdade que estamos incumbidos de pregar e viver.
Ser longânimo não significa portanto, ser tolerante com os pecados de nossa congregação. Em se fazer vista grossa para o pecado, nem muito menos de justificar o pecador, mas lembrar que não nos é dado fechar a porta da oportunidade para o arrependimento, seja pelo tempo que for necessário, e seja para quem for, enquanto não tivermos recebido da parte do Senhor nenhuma determinação para fechá-la.
Quando Paulo entregou o jovem incestuoso de Corinto nas mãos de Satanás para a destruição da carne, ele tomou tal deliberação congregado em espírito com a Igreja de Corinto e no poder de Jesus Cristo (I Cor 5.3,4) e não simplesmente
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porque ele havia ficado escandalizado ou então por ter perdido a paciência.
Lembremos que, especialmente muitos jovens na Igreja, levarão muito tempo até que tenham uma experiência real de conversão ao Senhor.
Se não formos longânimos com eles, nós os privaremos e a nós mesmos de vermos Cristo formado neles.
Pela Sua longanimidade o Senhor tem dado tempo a eles para que se convertam e a nós cabe seguir o mesmo exemplo de longanimidade do Senhor deles e nosso, de forma a cooperarmos com o Seu trabalho.
“21 Então Pedro, aproximando-se dele, lhe perguntou: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu hei de perdoar? Até sete?
22 Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete; mas até setenta vezes sete.
23 Por isso o reino dos céus é comparado a um rei que quis tomar contas a seus servos;
24 e, tendo começado a tomá-las, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos;
25 mas não tendo ele com que pagar, ordenou seu senhor que fossem vendidos, ele, sua
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mulher, seus filhos, e tudo o que tinha, e que se pagasse a dívida.
26 Então aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, tem paciência comigo, que tudo te pagarei.
27 O senhor daquele servo, pois, movido de compaixão, soltou-o, e perdoou-lhe a dívida.
28 Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos, que lhe devia cem denários; e, segurando-o, o sufocava, dizendo: Paga o que me deves.
29 Então o seu companheiro, caindo-lhe aos pés, rogava-lhe, dizendo: Tem paciência comigo, que te pagarei.
30 Ele, porém, não quis; antes foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida.
31 Vendo, pois, os seus conservos o que acontecera, contristaram-se grandemente, e foram revelar tudo isso ao seu senhor.
32 Então o seu senhor, chamando-o á sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste;
33 não devias tu também ter compaixão do teu companheiro, assim como eu tive compaixão de ti?
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34 E, indignado, o seu senhor o entregou aos verdugos, até que pagasse tudo o que lhe devia.
35 Assim vos fará meu Pai celestial, se de coração não perdoardes, cada um a seu irmão.” (Mateus 18.21-35)

Edition Notes

Published in
Rio de Janeiro, Brasil

The Physical Object

Format
Paperback
Pagination
x, 110pg.
Number of pages
110
Dimensions
21 x 14,8 x 0,7 inches
Weight
160 grams

ID Numbers

Open Library
OL25937608M

Work Description

Religião cristã

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